Immolation Season - Ep 20, Sheftu
Era a vez de Sheftu conhecer Eilinora, nada mais, nada menos que a irmã de Eric. Parecia que o segredo era a alma daquela família. Bem... Tirando o seu pai, que se fazia claro como o sol que nunca mais vira. Esta pequena visita que fizeram pela vida antiga dele apenas a deixava ainda mais confusa. O que acontecia mesmo diante de seus olhos, sem que o visse?
"Playback" by Sheftu Nubia
A noite aproximava-se do fim, tal como o nosso
caminho rumo a um passado assim não tão distante. Veio-me à memória a última
vez que tinha lá estado, os gritos que se ouviam da casa ardente, todos aqueles
que tinha morto quando lá estive e todos aqueles quadros. Eram décadas que
simplesmente eu lhe tinha eliminado como se nada tivesse existido alguma vez.
E, agora, também a sua energia tinha sido sugada.
Senti a sua mão sobre a minha que, sem que
tivesse dado conta, permanecia fortemente fechada. Meu rosto se elevou para ele
e seu sorriso aumentou ao mesmo tempo que a minha mão tinha sido cercada pelas
dele.
- Está tudo bem? – Perguntou-me, fazendo-me
recordar que ele conseguia saber exactamente o que se passava dentro da minha
cabeça.
O meu pensamento fora o suficiente para que
ele suavizasse o seu toque, relaxando um pouco. Porque haveria ele de estar
tenso? Desta vez tinha sido eu a apertar a sua mão, perguntando-lhe
silenciosamente se estava bem. Ele apenas sorriu. Meu corpo se aninhou ao dele,
enquanto ainda seguíamos caminho. Não importava que não estivéssemos sozinhos,
apenas o sentia a ele, só ele me interessava no momento. Seus dedos deslizavam
levemente sobre o meu braço, deixando finalmente que eu pudesse descansar,
fazendo com que eu entrasse num outro mundo, em que apenas o meu sorriso
permanecia. Finalmente podia descansar, deixando que o meu inconsciente tomasse
conta de mim juntamente com o seu doce toque. Eric estava novamente comigo, já
sentia a saudade desaparecer, esfumar-se com a sua presença.
Não sabia há quanto tempo que eu tinha
apagado, sentia apenas um calor sobre a minha pele, uma leve brisa que se
cruzava entre a respiração suave dele. Observei lentamente à minha volta,
estávamos debaixo de uma árvore com o breve amanhecer sobre o céu. À nossa
frente estava o que restava do incêndio que tinha provocado, ruínas de uma vida
inteira que Eric tinha vivido. Todas as suas recordações. Todas aquelas sobre a
família; tudo tinha simplesmente carbonizado quando a minha irritação tinha
sido desmedida.
- Vem… - Disse, levantando-se, erguendo-me
juntamente com ele. – Há algo que te quero mostrar.
Seguimos para perto das ruína, os seus passos
firmes me mostravam que tinha algo em mente que já há muito que andava na sua
cabeça. Duas grandes portas estavam no chão fechadas, deixando que o seu
interior se abrisse para nós quando Eric se aproximou. Parecia parte da antiga
casa, com o mesmo estilo, iluminada por luzes que provavelmente provinham da
energia solar.
A luz mostrava todo o seu esplendor, parecia
apenas uma arrecadação, mas tudo ficou diferente quando ao tocar na parede,
esta se abriu.
- Uns pequenos truques que fui aprendendo… -
Deu um breve sorriso, entrando pela pequena entrada. Eu segui-o, observando
atentamente à minha volta, existiam vários quadros de um lado, enquanto no
outro estavam estantes, repletas de livros. – Sim, tudo o que necessitava está
aqui.
- Manen… - Começou por dizer alguém atrás de
mim, que me fez virar e observá-la. Estava vestida de uma forma estranha, como
se não fosse desta época. Havia um certo misticismo nela, como se ela
conseguisse ser tão eterna como nós. Seu cheiro era distinto do que estava
habituada a sentir, intrigava-me e eu não sabia o porquê.
- Eilinora… - Disse Eric, fazendo-lhe uma
pequena vénia. – O que te traz aqui?
- Como haveria eu de faltar a este tão
aclamado encontro! – Começou ela por dizer, aproximando-se de mim,
inspeccionando-me como se eu fosse algum objecto. Seria tão simples apenas
arrancar-lhe a cabeça fora…
- Vá, vai em frente então. Arranca-me a
cabeça. – A sua voz confundiu-me, trazendo-me imensas perguntas para o que
estava a acontecer. – Claro que ele não te contou quem lhe ensinou tudo o que
sabe… Como deveria. E tu… - Disse, apontando para mim. – Terás brevemente as
tuas respostas. Habitua-te a ter calma, sim?
Observei-os, algo estava errado. Havia alguma
coisa nela que não me agradava em nada e ela bem o sabia, não era nada que
pudesse se tornar segredo com ela a invadir assim a minha mente.
- Precisamos de esclarecer tudo isto, Manen. E
espero que não demores muito com essa tua surpresazinha de última hora. Não cá
vieste para estares a divertir-te. Lembra-te o que vieste fazer. – Afastou-se
de mim rapidamente, segurando o queixo dele perto do seu olhar, observando-o
com o seu olho clínico. Apetecia-me saltar para cima dela, arrancar-lhe cada
pedaço do seu corpo e simplesmente acabar com ela. – Tenta acalmar ali a tua
aliada. Não queremos que lhe aconteça nada, não é?
Seus olhos se estreitaram para mim, como se me
estivessem a acusar de alguma coisa. O que foi? Tinha eu alguma culpa? Ela é
que estava a irritar-me, a culpa jamais poderia ser minha.
- Eu bem te avisei de que isto tudo era uma
péssima ideia. – Começou ela a dizer-lhe, enquanto saía. – Mas para variar tu
nunca me dás ouvidos. Especialmente quando tem a ver com essa daí. Não te
atrases! Não gosto de esperar, como sabes.
- Mas o que…
- Não temos tempo agora para perguntas. –
Interrompeu-me aproximando-se, levou-me para perto de uma cadeira e pediu-me
com o olhar para permanecer ali, sentada, quieta.
- Mas eu o preciso de saber… - Comecei por
dizer, mas não obtive qualquer resposta. – Não me vais dizer nada? O que está a
acontecer e porque estamos aqui?
- Se continuares a falar… Como queres que
termine antes de escurecer? – Disse, aparecendo a sua cabeça sobre o grande
cavalete que preparava com cuidado. – Já que fizeste o favor de eliminar todos
os rastos do teu passado na minha vida, creio que tenho direito a ter algum do
nosso presente?
Eu sorri. Está certo, ele tinha ganho desta
vez… Mas não o conseguiria por muito tempo… Eu não ia deixar o assunto morrer e
ele sabia muito bem disso. Não era só a teimosia que me caracterizava, a
determinação conseguia ser muito pior. Principalmente quando eu queria saber
alguma coisa.
A noite chegava lentamente, não que a
conseguíssemos ver debaixo do solo, sem janelas nem a saída aberta. Mas mesmo
assim conseguíamos ouvir os sons lá fora, além de todas aquelas câmaras de
vigilância que estavam no perímetro. Cada parte das ruínas era visto ao mais
pleno rigor, para que qualquer movimento fosse detectado.
Eram horas e horas que tinham passado, sem que
realmente pudesse pensar em nada, sem que cada segundo fosse ouvido. Era
bastante cansativo permanecer quieta por tanto tempo, e ele sempre tentava de
algum modo me deixar entretida, desde que estivesse quieta para que ele continuasse.
- Quando é que te despachas com isso? –
Perguntei-lhe, pela milésima vez. Ele voltou a sorrir, levantando-se e
observando-me enquanto sua mão passava sobre a minha face.
Fiz menção de me levantar, mas a sua mão
firmou-me, voltando para os meus lábios, para que eu ficasse calada.
Perguntei-lhe em silêncio o que se passava, ele apenas sorriu, aproximando-se
dos meus lábios, abraçando-me com ternura. – Sentias falta disto? –
Perguntou-me, deixando-me agora levantar-me para puder passar os meus braços
sobre o seu pescoço. Era a única guerra em que o vencedor e o vencido realmente
nunca importavam, o seu sangue podia matar-me mas também me dava vida…
O seu calor atraía-me para mais perto,
juntamente com os batimentos cardíacos que me torturavam a cada segundo que
permanecia perto. Minha pele fria queria ficar mais e mais próxima dele, todo o
meu corpo estremecia a cada novo movimento dos seus lábios sobre os meus,
navegando loucamente sobre a minha boca, tentando matar-me. Sim! Queria
matar-me de desejo, deixar-me completamente rendida ao momento, deixar-me fluir
entre os seus braços e simplesmente abrir o meu olhar. E eu o fiz, olhei-o
frente a frente, nossos olhos se cruzavam como labaredas incandescentes. Era a
loucura total e eu sabia disso, que fosse!
- Temos de ir… - Disse-me, entre a respiração
entrecortada, afastando-se de mim, esticando o seu braço para que eu colocasse
a minha mão sobre a dele.
O pôr-do-sol estava praticamente no fim quando
saímos de lá, seguindo uma trilha pela floresta, provavelmente indo ao encontro
daquela mulher desconhecida, pelo menos para mim.
Só ele sabia o que estava a acontecer e para
onde nós íamos. E, para variar, o factor surpresa sempre me deixava
completamente alerta. Por mais que tentasse parecer relaxada, a qualquer
segundo era capaz de arrancar corações pelo simples facto de me aparecerem à
frente. Os meus mecanismos de defesa pouco tinham mudado ao longo dos milénios,
por isso a minha mente por breves momentos desligou-se por completo do que me
rodeava, recordando-me novamente duma parte do passado que eu certamente jamais
queria recordar.
Aquele tinha sido o dia em que tudo
simplesmente passara pela morte, me deixando eterna juntamente com Ian. Uma
situação que nunca desejei, pois a morte sempre foi considerada uma bênção para
mim, e nunca realmente essa ideia tinha mudado. Mesmo antes de saber tudo isto
parte de mim sempre tinha odiado a ideia da imortalidade. E, agora, aqui estava
eu, amaldiçoada a continuar morta pelo mundo, deixando que cada ser que se atravessasse
à minha frente fosse condenado. Não, não era só para aqueles que eu tornava
eternos, também todas aquelas imagens, breves e quase esquecidas, dos rostos de
cada um das minhas vítimas. Apesar de que as que mais me marcavam, – Henry…
Kiya…Irina… - todas elas pesavam sobre o meu pensamento, as suas vozes, os seus
olhares… A raiva, a emoção, os seus últimos suspiros… Aquelas cinzas que
simplesmente voavam pelo vento, deixando mais uma vez que o meu passado
destruísse a vida, ou morte, a alguém.
Uma mão apertou a minha, levando-me novamente
para o que estava a acontecer.
- Está tudo bem? – Perguntou-me, tentando
procurar alguma réstia das minhas recordações
- Sim, agora está. – Suspirei, encostando a
minha cabeça ao seu peito enquanto chegávamos a uma espécie de cabana, como se
estivéssemos num outro mundo antigo… Não muito diferente do local onde tinha
estado aprisionada.
Existiam até algumas pessoas que circulavam,
talvez seguindo para as suas tarefas, lentamente como se nada neste mundo lhes
pudesse causar problema. E eu me perguntava como tudo isto era possível.
- Sabes, estas pessoas estão aqui porque
escolheram ficar protegidas por Eilinora. Eu sei que ainda não gostas muito
dela, e ela sente o mesmo por ti, mas isso é porque não se conhecem. – Fez uma
pausa, dando-me um pequeno beijo na testa antes de continuar. – Portanto, tenta
ficar calma. Tudo está bem… Depois te explico melhor.
Alguém nos interceptou, uma espécie de
guardas, vestindo umas túnicas com um símbolo que eu bem me lembrava. Aquela
cobra que Eric tinha no pulso era semelhante à que estes homens trajavam sobre
a túnica, olhei para ele perguntando-lhe o que era. Mas vi pelo seu olhar que
não era o momento para me responder. Tinha de ter paciência e saber esperar
para que as respostas fossem todas dadas. E, o meu pior problema, era que não
tinha nenhuma das duas para puder usar.
Saiu uma gargalhada enorme da sua boca, dando
para nós a atenção toda sobre cada um dos que passavam perto de nós. Já tinha saudades desse som, pensei,
olhando-o. Ele afastou-se ligeiramente de mim e aproximou-se dos ouvidos
daquele homem.
- Diz-lhe que já cheguei. Estaremos no local
marcado.
O homem assentiu, afastando-se de nós.
- Mas o que…
- Tem calma que já terás todas as respostas
que procuras… - Fez uma breve pausa, tentando controlar o riso. – Sim, eu sei
que não tens paciência nenhuma para isto agora e que só te apetece saltar-me em
cima. Mas, neste momento é muito importante para mim que o consigas fazer. Faz
isso por mim, okay?
- Está bem… O que queiras. – Disse-lhe,
suspirando. Ele começou a caminhar para uma pequena estrada, parecia bastante
antiga, como se existissem séculos de história nelas. Na minha mente houve um
breve clique, parecia que seguíamos a trilha para a casa onde o tinha deixado,
depois de o ter encontrado sozinho pela nascença. Será que…
- Exactamente. Agora, espera até lá chegarmos
que brevemente acabarás por saber o que estamos aqui a fazer. É importante para
mim e também o será para ti.
Eu até podia compreender que parecia
importante para ele, mas porquê todo este mistério? O que haveria para ser dito
e o que estava eu aqui a fazer com ele? Logo agora que todos os seus puderes
tinham simplesmente esfumado. O que iria acontecer daqui em diante e quem raio
era aquela tal de Eilinora? Tantas, mas tantas questões que estavam por
responder… Mas tinha a esperança que hoje elas fossem respondidas.
Rapidamente apareceram as fachadas da casa
sobre a nossa frente, tudo parecia ter congelado, como se voltássemos àquela
época, como se nada tivesse mudado por aqui. O que teria acontecido para
voltarmos para cá.
- Estás preparada? – Perguntou-me, e então
entramos sobre as grandes portas de madeira, que se abriam para nós…
Já há algum tempo que permanecíamos nesta sala
à espera da tal Eilinora, o silêncio era perturbador. Não sabia bem porque Eric
não me contava logo o que se passava e acabava logo com esta brincadeira. Eu
detestava não saber o que estava a acontecer, principalmente quando me
escondiam tudo. Era uma das alturas que eu gostava de também saber ler mentes,
assim conseguiria romper este momento infernal.
- Eu sei que queres respostas, mas não tarda
muito até que as tenhas.
- Não me sabes dizer logo o que se passa? –
Perguntei, tentando não demonstrar a minha irritação, sem muito sucesso. Logo a
porta se abriu, entrando a tal mulher com um sorriso enorme de orelha a orelha
ao vê-lo. Ele sorriu-lhe de volta, aproximando-se também dela, abraçando-a com
entusiasmo.
- Maninho, para a próxima que me deixares sem
notícias, eu darei cabo de ti! – Ela olhou para mim, fazendo depois uma careta
quando ele se aproximou de mim e abraçou-me.
Então eles eram irmãos? Como é que isso era
possível? Eu bem me recordo que os pais que eu lhe tinha escolhido não podiam
ter filhos, para além de não terem qualquer família que pudesse fazer perguntas
ou descobrir a origem dele. Observava cada um deles, tentando captar alguma
semelhança que pudesse dizer o seu grau de parentesco. Apesar do Eric até ser
alto, ela conseguia ultrapassá-lo facilmente, além de que o seu olhar não era
azul como o dele, mas sim verde, bem como a sua aparência ruiva nada tinha a
ver com o cabelo preto dele.
Será que Ian tinha iludido mais mulheres,
mesmo depois de eu o ter expressamente proibido com o nosso acordo? Minha mente
parou repentinamente ao sentir que as suas mãos me moviam para que eu o
observasse.
- Porque te importas com ela? Ela é uma deles… - O seu tom de reprovação
demonstrava exactamente o que ela pensava sobre a nossa espécie.
- Eilinora… Por favor, tenta ser um pouco mais
delicada. Afinal de contas somos família. Habitua-te. – Suspirou profundamente,
concentrando-se nos meus pensamentos, sorrindo depois de volta, ao dar-se conta
que na minha mente estava algo que nada era relacionado com tudo isto. – Como
deves calcular tudo isto é muito importante para mim, eu queria dizer-te antes
mas, como sabes, existiram muitos inconvenientes para que eu to dissesse.
Depois de ter pedido a ela que se sentasse
junto connosco, Eric contou a forma como a tinha encontrado, ao tentar
localizar-me, acabou por presenciar toda a determinação do seu próprio pai em
eliminar duas gémeas da raça humana, deixando-lhes um presente mortal no seu
ventre. Ele tentou ajudá-las, aproximou-se e começou a tentar avisá-las do
perigo de que se aproximavam.
Não que tivesse dado resultado, ele as tinha
encantado com o seu poder e era difícil fazê-las ver a verdadeira natureza
daquele que tinham escolhido para as desposar. A família reduzia-se apenas ao
seu avô que mais tempo passava a trabalhar em condições precárias do que a
proteger as suas duas netas do pior.
Naquela altura, ainda havia muito a aprender,
como iria ele conseguir inverter o encantamento a que elas tinham sido
submetidas. No final de contas, apenas uma se salvou, prometendo segredo
completo e entregar-lhe a criança que faria o seu espelho morrer de forma
horrível.
Por isso Eilinora viveu toda a sua vida junto
dos pais que eu tinha escolhido para o Eric, criando uma completa aversão a
qualquer tipo de vampiro que fosse, mesmo sem nunca ter sequer conhecido um.
Era contra a sua natureza aceitar que um monstro fosse próximo daqueles que ela
amava. Isso, ela mo disse, sem qualquer receio e com toda a determinação
possível. Caso acontecesse algo ao seu irmão, não tardaria em caçar-me até que
justiça fosse feita. E eu lhe dei razão, caso alguma vez o fizesse, que ela não
só me perseguisse por ele, mas também por mim. Eu jamais quereria viver se algo
acontecesse novamente a ele, e muito menos se fosse minha culpa.
Estávamos quase de saída quando ela lhe pediu
para falarem a sós. Ele atendeu o pedido e eu acabei por seguir em frente,
saindo da mansão, observando a natureza à minha volta que parecia intocável
pelo tempo.
- Eu tenho essa mesma sensação sempre que saio
de casa. – Disse Eilinora, fazendo-me voltar-me para ela. Parecia um pouco
constrangida, como se estivesse arrependida de algo que me tinha dito.
- Onde ele está? – Perguntei automaticamente,
vendo-a sozinha.
- Ele está ligeiramente ocupado com umas
coisinhas… O que te parece irmos dar um passeio por esta bela paisagem? – Eu
assenti, deixando que existisse um momento em que ela pudesse dizer o que
queria. Os primeiros passos foram apenas sobre o som do que nos rodeava, apesar
de que ela também podia ler a minha mente, o que não me alegrava muito. Sem privacidade
sequer para pensar, como se nunca fosse possível ter um pensamento só para mim.
- Queria pedir-te desculpa pela forma que te
tratei, mas a realidade é que não me arrependo em nada do que disse. – Fez uma
breve pausa, continuando depois de me segurar pelos ombros e observar-me nos
olhos. – Deves compreender a minha situação, nas últimas décadas não tenho tido
descanso e agora aparece ele, depois de vários meses sem dar sequer sinal de
vida, sem poderes e com um novo elemento na família.
Rapidamente mudou novamente de posição,
observando um pequeno casulo que estava preso sobre a árvore, tocando nele,
saindo uma pequena borboleta azul incandescente, que ia aumentando de tamanho,
até que se pousou sobre o seu ombro e ela sorriu.
- O meu irmão arriscou-se muito em salvar-te a
vida. E, agora que ficou ainda mais indefeso, nem consegue ver que há algo em
ti. – A borboleta voou directamente para mim, eu estendi a mão, fazendo com que
ela pousasse sobre a minha mão, mudando de cor, para um vermelho vivo, flutuando
sobre os meus dedos. – Não precisas de esconder-lhe as mudanças que estão a
acontecer.
- Do que estás a falar?
- Só porque o Eric não quer acreditar no que
os nossos pais nos contaram sobre um ascendente deles, não quer dizer que não
seja verdade. – Ela sorriu, fechando a sua mão sobre aquele ser avermelhado que
rapidamente se tornou novamente num casulo. Quando colocou novamente sobre a
árvore, continuou. – Parece que é possível, e pelos vistos, ele conseguiu
fazê-lo em ti.
- Mas o que… - Comecei por perguntar, parando
logo de imediato ao sentir uma pulsação conhecida que se aproximava. Voltei-me
para aquela direcção e lá estava ele, com um pequeno livro sobre o seu braço.
- Conseguiste encontrar o que querias? –
Perguntou-lhe ela sorrindo.
- Acredito que sim, Eilinora… - O seu olhar
passava de mim para ela. – E vocês, está tudo bem?
- Claro que sim, maninho. Já devias de saber
que sim… - A sua resposta só fez com que ele ficasse ainda mais desconfiado.
- Bem, acho então que está na hora de voltar
novamente para Inverness. Vens? – Perguntou-me, estendendo a sua mão.
- Lembra-te de vir cá mais vezes, e trá-la
contigo! Nem penses em voltar a deixar-me sem notícias!
- Vou tentar. Agora, temos de ir, antes que
seja demasiado tarde e ela tenha de se alimentar. Seria uma pena se tu fosses a
vítima!
- Ah! Ah! Ah! Maninho… Que divertido que ele
anda! – Replicou ela, quando já estávamos a seguir rumo às ruínas da sua antiga
casa.
Quando lá chegamos, a luz da lua iluminava as
ruínas de uma forma especial que daria um pelo quadro.
- Pedido registado com sucesso! – Brincou ele,
entrando no jipe. – Do que vocês estavam a falar quando eu lá cheguei?
- Quando? – Perguntei, fingindo-me confusa,
logo a minha mente me traía, dizendo-lhe que sabia muito bem o que ele perguntava.
Ah! Como eu detestava isso. – Está bem, está bem… Nós estávamos a falar de ti,
do quanto tramada eu estava se tentasse afastar-te dela.
- Tens a certeza? – Seu sobrolho franziu e eu
sorri. Que homem desconfiado que eu tinha arranjado! Talvez fosse melhor
procurar outro.
- Nem penses! – Gargalhou ele, aproximando-se
dos meus lábios. – Já estava com saudades disto.
- Do quê? – Brinquei.
- Disto! – Repetiu ele, continuando a tentar
torturar-me com os seus dotes mágicos. E como eu adorara senti-lo junto a mim,
novamente consciente!
Brevemente voltaríamos à mansão de Carmen,
onde certamente haveria de tudo, menos paz. Por isso tinha de aproveitar,
tentar arranjar forma de passar uns dias longe de tudo, desfrutar destes
momentos loucos. Talvez ao ficar por cá mais uns dias, ninguém se preocuparia!
- Tens a certeza? – Perguntou-me, com os seus
olhos a reflectir a luz da lua. Parecia um momento fantástico, poderia
guardá-lo na minha memória pela eternidade. Ele rapidamente fez sinal para
voltarem para trás, não me importava onde íamos ficar, nem como. Desde que ele
estivesse aqui, a meu lado, e que pudéssemos sorrir sempre! – Lembra-te de
fazer essa cara outra vez quando voltarmos para a tela!
- Não! – Disse eu, largando uma risada bem
sonora.
- Não penses que te livrarás de mim!
- Jamais! – Tê-lo do meu lado era muito mais
que felicidade! Era… Absolutamente, arrebatadoramente… Mágico!
Não importavam os poderes, a energia, nada
disso importava. Cada toque, cada som… Tudo nele era a mais pura das magias
para mim, não importava quanto tempo passasse… Ele era parte de mim,
completamente meu… Pela eternidade!
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