Immolation Season - Ep 9, Julian

Julian sentia-se completamente entediado. Tinha de ficar de olho na casa por horas, sem que pudesse fazer nada e muito menos divertir-se. Ainda há pouco tempo tinha sido renascido das cinzas, para quê? Simplesmente para ficar um escravo dos passos que as pessoas davam por aquela casa? Ele precisava de alguma animação na sua nova existência. E a teria, não importa qual fosse o preço.

"No Patience" by Julian Carriere

Sem olhar para Rania, apercebi-me do seu olhar fixo em mim, faziam já alguns minutos. Ela tinha regressado pouco depois de ir avisar Santiago. Umas horas passaram, e a minha saturação era já visível na minha postura; o meu interior já gritava por algo divertido. Finalmente Rania resolveu falar.
- Estás aborrecido?
- Nota-se assim tanto?!
- Hum... Por acaso…
- Vejamos... - Parei um pouco para respirar fundo. - Achas justo, estarmos aqui sem qualquer divertimento, enquanto Santiago tem o prazer de torturar?!
- Tens razão... mas são ordens...
- Ordens... Ordens… Ambos sabemos que estamos fartos de acartar ordens dele!
- Preferes então... - Fez uma pequena pausa. A sua voz caiu meio-tom, com receio que alguém a pudesse ouvir. - Rebelar?
- Sabes que é essa a minha vontade! - Respondi-lhe sem qualquer receio.

O nosso diálogo foi interrompido, assim que ouvimos uma pessoa que até agora estivera inconsciente.
- Olha o meio-vampiro acordou. - Disse Rania divertida. - Agora já podes ir e divertir-te um bocado. Que dizes?

Alguma acção era de facto o que eu precisava naquela noite. Estava tão entediado de não poder jogar um pouco com Carmen, que precisava de algo que substituísse isso.
Antes que pudesse dizer algo, Rania interveio novamente.
- Ah! Ah! Ah! Ah! Julian, parece que já vais tarde! Vai haver festa, mas tu não foste convidado! Ah! Ah! Ah! Ah!
- CALA-TE!
- Isso são ciúmes, Julian?
Nesse momento eu já não estava com cabeça para ouvir mais nada, e provocações eram respondidas à letra. Um soco fê-la voar uns metros.
- Não estou para isto! Vou dar uma volta. Fica de olho na casa! - Disse-lhe voltando-me na direcção contrária.
- Mas... Mas Santiago disse... - Disse um pouco atrapalhada, enquanto ainda se levantava do chão coberto de ervas.
- Eu não quero saber o que Santiago disse... Olha, se ele aparecer, diz que fui investigar! Eu não estou para passar a noite aqui a ouvir...
- Cenas escaldantes?! - Tentou ela.
- Coisas entediantes! - Na verdade só apetecia fazer com que ela comesse as palavras que tinha acabado de dizer, mas depois apenas fiquei pela resposta e desapareci em frente de seus olhos. Não queria ter que estar a prestar contas com Santiago no que dizia respeito a Rania. Já bastava ter que estar de olho nela, para que não acabasse eu mesmo morto às mãos daquela víbora.

Definitivamente meu pai devia ter acabado com a vida daquela vil criatura. Sentir aqueles dois aproximarem-se... Era como se aquela imagem estivesse nítida à minha frente, mesmo que eu não estivesse lá para os ver. Mesmo que as palavras não fossem ditas, eu sentia o coração daquele meio-vampiro bater e a aura de Sheftu a aproximar-se dele. QUE RAIVA!!! Ciúmes? Seria isto o ciúme? Ridículo! Não são ciúmes. Não podem ser... Era nojo, só podia! Nojo…

Tinha-me teletransportado até à cidade. Nem sei porque o fiz. Apetecia-me vaguear, afastar-me de todos os problemas e passados que pertencem às figuras daquela casa, e que eu tão minuciosamente tenho que investigar. A verdade é que estou farto. Todo este tempo há procura de algo que parece ser impossível ter em mãos. Se ao menos pudesse pegar no Dean e arrancar-lhe tudo!! Mas até que ponto seria uma decisão acertada?! Assim que Carmen visse Dean morto, não mais se importava com nada! O mais provável, seria queimar os livros e ninguém mais teria acesso ao poder que eles contêm. Já Santiago encarregar-se-ia de enterrar-me com as próprias mãos; portanto não via nada de positivo nessa escolha.

A noite mostra as suas tonalidades. A luz da lua ilumina as casas e ruas. Adiante, vejo uma rapariga correr ao encontro dos braços de um rapaz que a espera do outro lado da rua. Um abraço forte... Um beijo apaixonado... Idiotas! Se bem que davam um bom aperitivo.
Dei um passo em frente, para continuar a minha deambulação, mas imediatamente distraí-me com a igreja de pedra que estava mesmo ao meu lado. Mais intrigante era quem estava lá dentro. Não consegui ocultar o sorriso que se desenhou em meus lábios. Surpresa das surpresas!
A igreja era antiga, mas tinha umas dimensões consideráveis. Subi os degraus exteriores, abri a porta pesada de madeira, e vi duas filas de bancos de madeira que ficavam posicionados de forma a deixar um corredor no meio. Ao fundo o altar com um largo espaço em volta. E em frente, uma pessoa vestida de negro, voltada para o altar e de costas para mim.
Caminhei pausadamente, ao longo do corredor principal, até meio. A figura em frente não se moveu nem um centímetro. Resolvi então quebrar o silêncio.
- A confessar pecados passados ou futuros, Noryeg?
Finalmente aquela figura voltou-se para mim e mostrava um sorriso confiante. Alto, magro, de olhos castanhos e pele branca. Seus cabelos negros, finos, lisos e que tendiam sob a face e o seu olhar. Parecia ter crescido, mas só na maturidade, visto que os vampiros não envelhecem. E também demonstrava estar mais seguro de si. Muitos anos já passaram por ele, e é evidente que ele já não é a criança que fora no passado. Tinha os seus 20 anos quando fora transformado, mas na altura, o seu corpo já era o de um jovem adulto. A mentalidade é que era irremediavelmente da classe mimada a que pertencia, mas isso tinha mudado. Agora, a sua postura, era mais séria e mais ponderada.
- Julian... não esperava ver-te num local... como este!
- Uma igreja. É bom para meditar, sabes?! O silêncio, é algo divino! - Por acaso nunca tinha pensado nisso. Um local como este consegue ser perfeito para ter alguma paz. Paz daquele violino infernal.
- Vampiros e igrejas não são um conjunto, como é que eu hei-de dizer, saudável.
- Histórias que contam às criancinhas. - Disse-lhe sorrindo. Ele também sorriu de volta e depois dessa pequena pausa, continuei. - Ouvi dizer que pediste uma audiência com Santiago. Não me digas que vieste pedir para ser o seu moço de recados?
Noryeg fez uma pequena pausa, talvez ofendido com o que lhe dissera. Avançou um passo na minha direcção com a cabeça inclinada para baixo, e quando me respondeu, ergueu-a com um sorriso desafiador.
- Hum.. Pelo que vejo, Santiago já te tem a ti e àquela outra vampira para isso, não é verdade Jul... - Não lhe dei sequer tempo para terminar a frase. Lancei-me a ele com toda a força e embatemos os dois contra o altar, cujo impacto fez com que este rachasse e partisse em pedaços. Contudo, aquilo não ficou por ali. Eu não estava para ser insultado daquela maneira, e por isso soltei a minha raiva naquele vampireco. Ele também parecia não querer desistir tão facilmente. Respondeu com rapidez, impulsionando-me com força, e acabei por embater com um estrondo nos bancos da frente. A respiração ofegante de ambos não era sinal de abrandar. A velocidade da troca de ferimentos era estonteante. Uma brutalidade física, em que eu insistia por não usar a magia. Aquilo era algo pessoal e eu queria sentir o seu sangue como forma de pagar pelo que dissera. Mais um lançamento, e desta vez foi ele que caiu sob uma estante de velas cujo lume começava agora a incendiar as suas roupas. Uma cena bastante cinematográfica, à qual contemplei do lugar onde estava.
Finalmente lá conseguiu extinguir aquelas chamas, antes que o consumissem. Quando ele veio lançado novamente na minha direcção para mais uma investida, apenas o prendi pelo pescoço.
- Não vejo porque não acabar contigo. - Disse-lhe. - Foi interessante, devo dizer que me surpreendeste, mas chega agora o teu fim. Queres dizer algo?
- Não! - Disse. - Não o ataquem! - Reforçou a sua ordem, ainda com a voz rouca.
- Desculpa?! - Perguntei, enquanto soltava a sua garganta, para ter a certeza de que percebia o que ele queria dizer com aquilo. 
Foi quando reparei que estávamos os dois no centro de um círculo composto de seis elementos também vestidos de negro. Como é que eu não tinha sentido a sua aproximação. E quem eram eles? No entanto, não me deixei intimidar e rematei.
- Estou a ver. Porque no passado Santiago não te acolheu no nosso grupo, resolveste criar o teu de raiz. Mereces louros pela iniciativa. No entanto, eu também sei uns truques, e como estou sem paciência, acho que vou acabar convosco, aqui e agora. Pelo menos podes ficar feliz, porque vais ter com os teus papás.
O seu olhar enfureceu, e eu apenas limitei-me a apertar com mais força. Queria ver a sua luta para fugir da morte certa. Os outros atacaram em fúria. Mas bastou que eu levantasse a minha mão direita no ar, para que eles ficassem nos seus lugares a contorcer-se de dor.
- Julian... - Noryeg tentou falar. E eu deixei. - Santiago não vai ficar satisfeito quando souber que aniquilaste a guarda que ele contratou para o ajudar.
- Como dizes?
- Estamos ao serviço de Santiago quer tu queiras, quer não!
Libertei-os finalmente da agonia que lhes estava a provocar, sem contudo baixar a guarda. Sabia que se Santiago estava envolvido, eu tinha que ter cuidado.
- Tu sabes o que está em jogo, não é? É disso que se trata! Poder! Como é que soubeste? Sim, porque não virias se não tivesses certeza do que se passava. Quem foi?
- Isso querias tu saber! - Respondeu, e depois passou por mim em direcção à saída juntamente com o resto da escumalha, sem mais uma palavra.
Passaram sem receio, um a um, a meros centímetros de mim. A raiva crescia, à medida que os via afastar-se. Santiago... Sempre a meter-se no meu caminho! Uma maldição vinda do mais tortuoso inferno.
- Tiveste sorte... Doce vampiro. - Ouvi uma voz feminina dizer. Depois reparei, que mesmo ao meu lado acabara de passar o último elemento do grupo. Uma vampira...
- Sorte? - Perguntei-lhe também para que só ela ouvisse.
Ela voltou-se ligeiramente na minha direcção, sem parar a sua marcha e sorriu.
- Apanhaste-me desprevenida. Senão, terias sido tu a suplicar pela vida. - E saiu.

O que é que ela queria dizer com aquilo? Pensaria ser mais poderosa que eu? Certamente não aparentava ter nada de especial, e no entanto aquela forma de desafio no final deixou-me com vontade de saber mais. Já não bastava a quantidade de coisas que tinha em mãos, agora ainda mais este grupo para me inquietar a paciência?
Saí da igreja nem sequer preocupado em ocultar os sinais de batalha deixados para trás. A polícia poderia encher isto de cientistas forenses só para chegar à conclusão que foram uns delinquentes que acharam piada em provocar distúrbios na igreja local. Nunca iriam associar isto a vampiros, e muito menos a mim.

Continuei o meu caminho, não sabendo bem que direcção tomar. Ainda era cedo para voltar para a mansão e por outro lado estava completamente tentado a ver como Carmen se estava a dar com a surpresa. Mas seria idiota se o fizesse.

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