Transilvania Season - Ep 47, Elizabeth

Beth nunca acreditaria que abandonaria o seu recanto, virando-se contra Gustav e toda a sua equipa, rumo ao novo mundo que tanto detestava. O que a fazia agir assim, tão repentinamente? Talvez fosse mais do que pequenas pistas, mais do que mistérios que ela precisava de responder. Ninguém sabia o que estava para vir...

"Lost In The Path" by Elizabeth Wood

- Matas-te um vampiro? – Perguntei, sem ter a certeza de que aquilo me convencia.
 Ela acenou.
 - Qual deles foi? – Continuei, mas ela cortou-se a responder.
 - Não creio que isso importe agora - «Podes crer que importa», era a deixa na minha cabeça. Mas não falei.
 Novamente, aquele outro homem – que, segundo a minha rápida analise, devia tratar-se de um vampiro – lançou-lhe olhares confusos e preocupados, deixando-me novamente afogada em dúvidas, como se houvesse algo entre eles os dois que não estivesse a ser apropriadamente comunicado. Podem crer que isso me tira do sério.
 Agarrou-lhe a mão, num gesto descontraído. Sheftu deixou o olhar escapar para Kiya, jazendo sobre o colo do suposto apaixonado – não me parecia que andasse aos beijos com um amigo de longa data -, e deu-se novamente aquele estranho momento de comunicação não entoada.
 - Não consegues arranjar algo para a Sheftu levar? Quanto menos nas vistas dermos melhor. – Pediu Eric.
 - Onde tencionam ir? – Interroguei de imediato, tentando esconder a quantidade de pensamentos que faziam os seus turnos na minha cabeça, insurgindo-se em flashes confusos e muito pouco precisos.
  - Acredito que seja para casa… - Respondeu Sheftu, fazendo com que mais de uma centena de ideias se insinuassem… Para casa? Eles tinham uma casa? E eram ambos poderosos… E eu precisava, definitivamente, de um lugar para ficar. Gustav não era estúpido ao ponto de não se aperceber de que fora eu, e depois de tudo o que tinha feito não me parecia que fosse adequado ficar naquele lugar… Enfim, tudo o que é bom tem um fim… Se a minha mãe tivesse vivido tempo suficiente, provavelmente arranjaria forma de adequar isso a alguma situação vivida por mim… Ou talvez não. De qualquer forma, tinha de esvaziar a cabeça de pensamentos lúgubres, ou eles iriam misturar-se com outros e eu acabaria a atacar uma parede ou a incendiar o local, o que iria, obviamente, atrair as atenções sobre nós. Consegui interceptar o olhar demasiado rápido de Eric na minha direcção… Como vários bruxos, magos ou feiticeiros, Eric poderia ter uma espécie de percepção avantajada acerca do que o rodeava. Talvez tivesse captado a minha súbita tensão, o que não seria nada invulgar em alguém como ele.
 - Sim, não antes de fazermos uma paragem para nos juntarmos aos outros. – Proferiu este ultimo, arrancando a ultima sombra dos meus devaneios algo furiosos.
 Hum… teria de lhes perguntar rápido, antes que a minha oportunidade fugisse.
 - Posso ir com vocês? – Não me pareceu de que um “Por Favor!” fosse necessário. Pareceram ter sido ambos apanhados de surpresa, e eu não tinha a certeza em ralação a ter sido agradável… Aliás, a cabeça de Eric olhava de uma para a outra com uma rapidez alucinante, fazendo-me erguer ligeiramente as sobrancelhas. Será que não nos tinha visto vezes suficientes? A maioria dos feiticeiros até são de raciocínio rápido.
 - Sim, claro. – Atrapalhou-se Sheftu. Quase que sorri. Já tinha para onde ir, e não teria de confinar os meus dias à assombração de uma aldeia. Um ponto para mim… Embora eu não soubesse contra quem estaria a competir.
 - Eu já volto… - Despedi-me, saindo rapidamente da divisão.
 Não consegui evitar um sorriso triunfante. Subi dois lanços de escadas antes de parar numa espécie de patamar, com uma portinhola da madeira que dava para uma salinha suja.
 Havia uma cama coberta de lençóis aos farrapos no chão, daquelas portáteis e metálicas, que chiam quando alguém se deita encima delas, e uma enorme secretária, cheia de ficheiros deitados ao acaso.
 Na pequena cama, deveria dormir um guarda, mas naquele instante ele teria subido para ajudar os outros.  
 Um súbito ruído atrás de mim fez-me desviar o olhar.
 Nas escadas de pedra, subindo devagar a fatigadamente, estavam um homem e uma mulher com as roupas sujas e os cabelos desgrenhados, feiticeiros que eu reconhecia devido a uma tortura, a ajudarem-se mutuamente na subida dolorosa. É claro! Sem guardas a cirandar por ali e com todo o castelo em alvoroço, ninguém iria perceber como é que tinham desaparecido.
 A mulher viu-me e tremeu de medo, mas eu ri-me, e o seu olhar tornou-se confuso e cauteloso, empurrando o homem com tal distracção que ele quase caiu das escadas abaixo, o que só veio ampliar os meus risos.
 Regressei com o olhar à sala. Independentemente do cheiro nauseabundo das camas e das roupas que por ali jaziam, era obvio que havia lá uma secretária durante o dia. A secretária estava coberta com fotografias, tinha sido pincelada de branco e estava demasiado limpa para pertencer a um homem.
 Aproximei-me dela, observando curiosamente o papel cor-de-rosa perfumado misturado com as folhas brancas formais, e peguei numa delas, picando um dedo num pionés oculto no meio da confusão agitada de papéis.
 Quase me desmanchei em gargalhadas. Eram folhas de um diário, cuidadosamente escritas à mão com tinta negra e com corações desenhados em volta de alguns nomes. Perguntava-me porque seria que Gustav escolhia gente daquela, que começava as frases com «Querido diário».
 Voltei a colocar a folha na mesa, olhando agora para a cadeira igualmente pincelada de branco. Sobre as suas costas, jazia um enorme casaco felpudo, cor de creme.
 Peguei nele e regressei à sala., tropeçando num objecto qualquer. Era uma pequena pulseira negra. Apanhei-a com um gesto rápido.
 Pelo corredor, conseguia ouvir passadas lá em cima, os gritos e o pânico a amainarem… Deveriam estar a preparar-se para atacar de forma organizada, e nada era mais forte do que todo aquele castelo num ataque organizado e massivo.
 - Preparados? – Perguntei, assim que passei a porta, sem prestar atenção a mais nada senão aos dois rostos à minha frente e aos casacos quentes que fazia a minha mão cobrir-se de gotículas de suor. - Que clima pesado que anda por estes lados… Então, já se decidiram em matá-la?
 - Não – Respondeu Sheftu, agarrando no casaco que ainda estava caído, como um grande bicho morto, na minha mão.
 - Não consegui arranjar nada melhor… O castelo começa a ressurgir do ataque, não demorará muito até que nos procurem por aqui… Devemos de sair o mais rápido possível. – Acrescentei.
  - Não viste a Dora? – Perguntou Sheftu, e eu ergui a outra mão, na qual estava a pulseira negra, que estremecia de cada vez que balançava e tocava no ouro pendente do meu pulso direito, refulgindo desgostoso a cada contacto frio, como se reclamasse contra o toque de tal objecto carregado de magia protectora. Não pareciam gostar muito uma da outra. O atacante e o defensivo.
 - Parece que a única coisa que restou dela foi mesmo isto – Esclareci, e Eric resmungou qualquer coisa ao observar a pulseira. Provavelmente conhecia o objecto.
 - E ela? – Perguntou Sheftu, fitando o corpo imóvel de Kiya.
 - Não queres fazer como o teu homem disse e retirar-lhe o último suspiro de vida? – Perguntei, ansiosa por que ela me atribuísse a tarefa que era, reconhecidamente, sua por direito.
 - Não… Podes fazê-lo. – Apeteceu-me dar pulos e vivas, mas contive isso. Gastaria tudo mais tarde.
 Não hesitei um segundo, esperando apenas que ela estivesse um pouco afastada.
 - É a minha vez de brincar. – Sibilei, tão baixo que nem Sheftu nem Eric poderiam ouvir-me.
 E, com um refulgir no meu pulso, um súbito fogo na minha anca e um brilho entusiástico no meu olhar, o meu fogo atingiu-a, fazendo-a gemer e contorcer-se com as forças que lhe restavam. Tentei não rir, por respeito, enquanto as chamas líquidas tomavam o rumo das suas veias, de volta ao coração, sem deixar que isso lhe fizesse mal. O meu fogo vivo arrastava-se lentamente por cada centímetro do seu corpo impotente, obrigando-a a sofrer, concentrando-se na cabeça, em volta do estômago, nas paredes do coração… O que faria eu? Explodia-lhe com o cérebro? Dilacerava-lhe o peito? Amputava-lhe os membros? Teria de ter uma morte digna.
 Bem, deixemos o fogo fazer o resto. Com um pensamento decisivo, deixei de a proteger. Agora, o fogo que lhe percorria as veias era mortífero, envenenava-a. Meia-vampira como ela era, resistia mais. Mas ainda tinha o seu lado humano, que morria facilmente. Nunca fiquei mais feliz por saber que alguém tinha genes humanos. Com um último fôlego de dor e um grito de agonia, as chamas concluíram o seu trabalho e Kiya morreu, ficando totalmente imóvel, com os olhos vazios a olharem direcções opostas, as mãos a afrouxarem o aperto dos punhos e o maxilar a abrir-se, exibindo a vasta colectânea de dentes marmóreos.
 - Descansa em Paz – Murmurei, por entre dentes, tendo o intento de sair… Mas e se…? Bem, eu já ia embora, tinha essa segurança, e Gustav não me encontraria. Não tinha nada a perder.
 Peguei num pequeno instrumento semelhante a um espeto, mas bastante mais afiado, comecei a escrever, lentamente, na barriga branca como cal de Kiya, rasgando o vestido.
 Com um toque suave e fino da minha caligrafia, rasguei-lhe a carne como se fosse manteiga derretida, escrevendo delicadamente:

 Eu disse-te que te irias arrepender… Tenta levá-la morta para a cama!
 Cumprimentos,
  Da tua querida.

  E, nesse momento, abandonei a sala com um sorriso.
  Fui encontrá-los à espera no corredor, Sheftu sem uma única pinga de arrependimento… Ou talvez apenas se recusasse a mostrá-lo. Seguimos as escadas a correr e passámos pelo caos em decadência do salão, saindo pela porta principal para a cidade que, aos poucos, tentava recuperar para um ataque organizado.
 Sentia várias pessoas à minha volta a correr na minha direcção, tentando travar-me, mas todas elas caiam de forma inesperada no chão, sem saberem o que lhes tinha acontecido. Só nessa altura me apercebi do verdadeiro significado das palavras de Eric ao dizer que haviam mais. A cidade estava cheia de cadáveres, alguns dos quais aparentando tiros nos corpos caídos.
 Depois disso, saímos do castelo e deixámos de ser seguidos, rumando a algum lugar desconhecido.
 Era uma cidade, onde eu não me sentia nada confortável devido aos imensos olhares que me deitavam, devido às curiosas vestes, e onde não poderia matar ninguém, sem que se armasse um grande escândalo. Nunca fora lá grande fã de grandes cidades.
 Entrámos num prédio alto, branco, e dirigimo-nos a uma porta negra.
 Eric abriu a porta emperrada, dando vista para uma desgraça completa. Objectos partidos e um cadáver, tudo embrulhado numa enorme confusão.
 - Oh… que rica decoração. - Comentei.
 - Tenta dar o mínimo nas vistas sim? – Pediu Eric, e eu fitei-lhe as costas, furibunda. Quem era ele para mandar em mim? Não os acompanhara para fazer amigos.
 Ele contorceu-se numa espécie de espasmo, olhando para Sheftu com um ar incrédulo de seguida… Furiosa como estava naquele momento, aquilo só me deu vontade de o esganar, devido à sua inexplicável forma de comunicação.
 Ouvi passos atrás de mim e virei-me. Atrás de mim, erguia-se uma mulher de pele branca, cabelos ruivos e olhos cinzentos, provavelmente também uma vampira. O seu olhar percorreu-nos a todos, mas deteve-se em mim, com ar extremamente desagradado.
 - O que se passou? – Interrogou Eric à mulher desconhecida.
 - Não interessa, temos de ir embora, agora! – Respondeu a mulher. O seu olhar passou de Sheftu para mim, fazendo um trejeito – Não sem antes me dizerem, quem é ela?
 - Elizabeth Wood. – Afirmou Sheftu, e o meu olhar viajou da ruiva até ela, de forma automática – É uma amiga.
 A ruiva não pareceu nada aliviada com a resposta. Aliás, até ficou mais carrancuda.
 - Óptimo saber que fazes amizade, enquanto estás em cativeiro.
 - Não fui só eu que trouxe uma amiga nova, não é? – Retorquiu Sheftu, claramente aborrecida como se aquilo já se tratasse de um hábito.
 Olhei para a ruiva, à espera de ver uma reacção. A sua cara começou a contorcer-se de raiva e… Arrependimento?
 - Não me interessa, ela não vem! – Embirrou. Viva, sou nova aqui e já começaram as discussões por minha causa. Que coisa linda.
 - Ouve lá… - Sibilou Sheftu, em tom de ameaça, enquanto se aproximava. – Ela vem, lá porque pensas que tens o rei na barriga não significa que mandas! Continuo a ser a mais velha e, continuo a ter mais poder…
 A outra ergueu os lábios provocadoramente, mostrando os dentes afiados, que carregavam toda a sua raiva.
  - Não…me…irrites, Sheftu Nubia. – Articulou. - Da mesma maneira que te salvei, volto a entregar-te aqueles malucos medievais. A casa é minha e eu decido quem vai ou não!
 Empurrou-a e agarrou-a pelo pescoço, continuado de seguida.
– Não fazes ideias de quanto mudei e, tenho força para destruir-te! – Largou-a de forma pesada, acrescentando – Limpem as impressões digitais de todos e, vamos para casa!
 Olhou novamente para Sheftu.
 - Já temos o que viemos buscar. – Concluiu.
 E saiu porta fora, batendo com ela violentamente.
 Eric soltou:
 - Bem, eu tenho de ir ver como ela está… - E partiu atrás dela, deixando-me ainda mais confusa acerca desta ligação tão amistosa com aquela que, aparentemente, não se dava nada bem com Sheftu.
 - Bem, pelo que me parece tens aqui uns momentos animados. – Matutei.
 Ela sorriu de forma ligeira.
 - Nunca te disse que a tua vida iria ser monótona.
  - Ainda bem, sempre consigo distrair-me um pouco. – Suspirei.
  - Claro, já sabes que sempre que precisares…
  - Sim, eu sei… - Respondi.
  - Ainda bem – Retorquiu.
  Entretanto, a mulher ruiva regressou, parecendo mais calma.
  - Deixem-se de tretas, vamos para casa. – Olhou-me intensamente, ainda pouco à vontade... – Bem-vinda, Elizabeth.
  Eric, que entretanto regressara, murmurava em surdina com Sheftu, sem que eu pudesse – ou tivesse interesse em – compreender o que diziam.
  Olhando para as paredes, sem ter a certeza acerca do que deveria fazer, lembrei-me de algumas palavras que a ruiva tinha dito. Não sabia se isso me cabia a mim, mas já que agora iria “viver”com eles, então deveria ajudar naquilo que pudesse.
 Tentei recordar-me das palavras correctas, que se tinham perdido na minha mente… Entrei em pânico. Será que não o tinha trazido? Mas depois revistei um compartimento interior do meu desadequado vestido roxo, e lá estava ele.
 Negro, com a capa feita de couro, e as páginas cheias de rabiscos de tinta preta. Alguns extremamente floreados, pertencentes à minha mãe, outros delicados e firmes, escritos por mim. Cada um daquelas páginas continha anotações próprias, sobre feitiços e, embora muito raramente, um ou outro líquido. Decorara as páginas do livro, portanto sabia qual deveria procurar.
 E tal como previra, lá estava ele. Entre um feitiço de reconstrução ligeiramente ultrapassado e uma pequena nota sobre propriedades do funcho quando misturado com seiva de pinheiro em bruto, um feitiço simples para remoção de impressões corporais – que incluíam não apenas as impressões digitais, mas as mais diversas marcas deixadas pelo corpo.
 - Esta tudo limpo – Anunciei, fazendo com que a ruiva erguesse um pouco as sobrancelhas – Podemos ir.


 Tínhamos apanhado um avião pequeno e vazio – segundo Sheftu, tinham comprado todos os lugares abordo para que ninguém desconfiasse de nada e pudéssemos falar à vontade -, que abanava um pouco devido à turbulência.
 Estava sentada num lugar de trás, ainda embrenhada nos meus pensamentos sobre tudo o que se passara. Durante a viagem, tinham-me sido confiados todos os detalhes sobre cada um deles. A ruiva, de nome Carmen, era ainda mais imbecil do que eu pensara. Namorava com um humano. Um humano, note-se bem. De nome Dean… Pois, é àquele eu não podia fazer mal. Juntamente com esse, havia outro – Frankie. Aparentemente, não haviam registos de que ele tivesse qualquer tipo de relação amorosa com qualquer membro do grupo – ou com qualquer pessoa -, mas era primo de Dean e, como tal, intocável.
 Dean estava confortavelmente sentado ao lado de Carmen, em primeira classe, da mesma forma que Sheftu estava lado a lado com Eric – contra esta relação eu não tinha problemas, visto nenhum deles ser humano.
 Eu fora a única que decidira sentar-me em classe turística, a fim de evitar estar no meio de tanta gente tão apaixonada.
 Por isso, era a única pessoa sentada nos bancos azuis desconfortáveis, num estado sonolento, encostada à janela, a observar as nuvens.
 Havia algo de nostálgico na sua perpétua semelhança que me envolvia numa espécie de transe, como se estivesse prestes a adormecer, apesar da falta de sono.
 Os acontecimentos dos últimos dias estavam a repetir-se, vezes e vezes sem conta, na minha cabeça.
 Nunca pensara deixar Gustav até à relativamente pouco tempo… Tudo o que tínhamos passado juntos… Mas como pudera eu pensar que ficaria lá para sempre, se para sempre seria a eternidade? Ninguém pode fazer o mesmo durante tanto tempo. As coisas estão sempre a mudar, e tendo em conta que ainda existem vários milhares de anos à minha frente, seria demasiado considerar que nunca aconteceria nada entre mim e Gustav… Fora um erro nunca ter pensado no futuro, mas mesmo que o tivesse feito, não me parecia que eu encarasse isto como uma possibilidade. Eu chamar-lhe-ia delírio há umas semanas. Mas o lado irónico da vida é esse mesmo: As pessoas nunca se vêem a fazer algo até terem feito, e a maioria acaba por fazer aquilo que contraria todos os seus pensamentos. Neste momento, por exemplo, eu estava a fugir para Inverness com um monte de gente apaixonada, quando há alguns dias estava a treinar feiticeiros para destruir e matar de forma eficaz. Que raio de semelhança existe entre essas duas coisas?
 Alguém se mexeu uns metros à minha frente, fazendo com que o meu estado dormente me abandonasse e o meu pescoço se esticasse para ver por cima dos bancos.
 Parecia que, afinal, não estava sozinha na classe turística.
 O tal outro rapaz, Frankie, acabara de se levantar, encaminhando-se lentamente para a traseira do avião. Tinha uma estrutura bastante semelhante à do seu primo, bastante encorpada, mas os seus cabelos eram negros, espetados numa crista, e os olhos azuis, assim como a pele mais escura. Envergava uma espécie de top cinzento e umas calças de ganga… Estremeci ao pensar que esse seria, muito em breve, o meu novo estilo.
 - Também estás sozinha? – Perguntou, erguendo levemente as sobrancelhas. – Eu sei, lá à frente o ambiente enjoa um bocado…
 Soltei uma espécie de rugido, que o fez largar o sorriso e seguir o seu caminho ate à casa de banho… Apesar de tudo, não podia deixar de lhe reconhecer alguma razão. Os casais a apreciar o rescaldo eram ligeiramente enjoativos.
 Encostei novamente a cabeça à janela, dedicando-me à minha anterior actividade de fitar as nuvens debaixo de mim.
 Seria uma longa viagem até Inverness, mas não havia pressa.
 Isto porque, de qualquer forma, eu não sabia o que ia fazer quando lá chegasse.

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