Immolation Season - Ep 4, Carmen
Fuga. É isso que a nossa caçadora está a fazer no momento, recusando-se a aceitar cada uma das mudanças que parecem querer a sua cabeça numa bandeja - ou, até mesmo, a sua honra. Muita pouca gente conseguiria dizer que estaria tão amaldiçoada quanto ela, que agora simplesmente caminhava para longe de tudo.
"No Mercy. No Sympathy" by Carmen Montenegro
Estou andar. A andar. PORRA! O chão debaixo dos meus pés não
acaba, por isso irei continuar a andar. MALDITO INFERNO! Andar para esquecer os
problemas, há melhor? Só mesmo a bebida mas, eu não sou humana logo, tenho que
andar!
Esperei um dia inteiro, numa pequena casa ali perto abandonada,
para puder sair agora à noite e simplesmente, não posso parar de andar. Mesmo
que a noite esteja fria, mesmo que o frio seja demasiado para aguentar; afinal,
continuo com a mesma roupa desde que voltei de Transilvânia e apesar de lá
estar mais ameno aqui, o frio à noite era muito. Será que o facto de andar por
Inverness com um corpete e calças de ganga seria um factor a ter em conta?
Que interessa?
Tenho que andar. Andar para esquecer Lawrence e os seus
livros de magia. Maldita hora em que tive conhecimento daquelas páginas
carregadas de feitiços!
Andar para esquecer
Santiago que quer o poder, oh! E a minha cabeça numa bandeja também!
Provavelmente vai fazer-me pagar por ter morto o seu filho…ah! E, os livros
claro!
Andar para esquecer
Julian e a sua sede de destruição. Quem disse que os mortos não voltam à vida,
que venha ver Julian!
Andar para esquecer o
facto de Eric estar mal por minha culpa.
E, finalmente,
continuar a andar para esquecer o facto de o Dean querer ser vampiro. Ahhhhh!
Raio de existência que só tenho problemas à minha frente, qual peças de dominó
que teimam em não cair.
Nem sabia por onde eu ia mas, eu estava simplesmente lançada
numa caminhada nem fim.
Sem dar conta fui parar ao bar onde encontrei-me com Dean
pela primeira vez, e, sinceramente nem tinha vontade de lá voltar por isso,
continuei a caminhar.
As ruas de Inverness estão vazias, à medida que a noite cai
e avança assim se recolhem os humanos para as suas casas e suas camas. Apenas
alguns noctívagos permanecem, que enchem os bares e dão pouca vida as ruas.
Virei a esquina quando vi um grupo de homens ali ao longe,
perto da porta de um outro bar numa conversa animada. Dei-me conta da sede que
tinha, conseguia ouvir os seus corações numa sinfonia desenfreada. Cravei os
olhos num jovem de tez caramelizada mas, com salientes olhos verdes e sorriso
brilhante. Trazia na mão um copo com uma bebida alcoólica qualquer e estava
encostado a uma mota. Estava acompanhado pelos amigos mas, eu só tinha olhos
para ele. Comecei uma caminhada confiante na direcção daqueles jovens, notaram
em mim assim que me aproximei o suficiente.
- Hey, tu! - Apontei o dedo ao jovem de pele de caramelo.
Reinou o silêncio entre os homens, estavam simplesmente espantados com a minha
atitude. - Segue-me.
- Wow…acha mesmo que vou segui-la assim, do nada? - Perguntou
o jovem. Eu sorri não acreditando que ele não o fosse fazer. Girei sobre mim
mesma e comecei a caminhar. Os homens cochicharam entre si, conseguia ouvir
incentivos dos outros: “Vai, meu! Ela é muita gira” “Vai! Vai”, já ele dizia:
“Não sei…é estranho”. Porquê que os homens se fazem de difíceis, quando na
verdade querem tanto.
Eu segui em frente, sabia que ele me seguia com os olhos
cravados no meu andar. Quando chegamos a um sítio mais calmo longe de olhares
curiosos em voltei-me repentinamente e ele parou. Observei-o com atenção,
rodeando-o de cima abaixo; Gostava da sua altura, era mais alto que Dean. A sua
pele era de caramelo, podia jurar que sentia o gosto – ou pelo menos
recordava-me do que era suposto ser – e quase podia comê-lo. Estendi a mão e
perdi os dedos nos seus caracóis suaves. Quando o enfrentei frente a frente, o
jovem ria-se. Aposto que o seu sangue saberia muito bem. Que sede!
- Tu és bonito.
- Chamaste-me até aqui para dizer que sou bonito?
Abri um sorriso gentil. Não, ele era muito novo para morrer
ali. Apesar do seu tom de caramelo ser atractivo e aqueles olhos verdes escuros
serem tentadores. Não, era demasiado novo.
- Vai-te embora. - Disse eu. Resolvi retomar o meu caminho e
o homem riu-se.
- Espera, não queres mais nada…?
Parei, girei para encará-lo.
- Preferias que te matasse?
Vi-o empalidecer e recomecei a caminhar. Deixei-o para trás
enquanto retomava o caminho pisando o soalho por debaixo dos meus pés. Iria
continuar assim, quem sabe se não percorria Escócia a pé?
Virei à direita e entrei numa zona da cidade que nunca tinha
visto, era uma rua longa com pequenos prédios de cada lado, era sombria pelo
facto de alguns candeeiros de rua estarem acessos e outros não. A calçada era
composta por grossas pedras de calçada e, a rua estava vazia ou aparentava
estar. Iniciei a minha caminhada por essa rua abandonada de tudo e todos mas,
não demorou até ver que não estava sozinha, voltei-me e vi um homem alto e
grande. Senti passos atrás de mim, olhei por cima do outro e vi que tinha gente
atrás de mim, mais dois deles.
- Estás perdida, linda? - O seu sotaque escocês era muito
carregado e eu sorri. Esta gente não sabia reconhecer quando alguém estava de
mau humor?
- Não.
Ele riu-se, começou a avançar para mim. Abriu o casaco e
tirou um taco de basebol, batendo-o na mão. Enquanto isso, sentia os outros
dois aproximando-se com passos cuidadosos.
- Não queres passar esse belo colar que aí tens?
Passei a mão pelo pescoço e sorri. Finalmente, encontrei o
petisco desta noite.
- Vem buscá-lo.
Ele riu-se, todo divertido com a minha atitude.
- Já viram rapazes? - Disse apontando para mim. Duvidava das
minhas capacidades. Hum, calhava bem…estava com sede. - Ela julga que é mais
forte que eu…
- Não julgo. Eu sou.
A sede dominou-me e dei duas longas passadas e levando o
homem ao chão. Ele berrou assim que viu as minhas presas e os meus olhos mas,
não o ouvi mais, pois cravei as minhas presas no seu pescoço o mais fundo que
podia. Ele ainda lutava por isso, dei um longo trago no seu sangue e, apesar de
tudo, ele não deixou de lutar desferindo um valente soco na minha cabeça. Não
larguei o seu pescoço, pelo contrário arranquei-lhe um bocado da carne do seu
pescoço, vendo-o a esguichar sangue por todo o lado. Cuspi o bocado de carne, e
olhei para o homem que continuava a estrebuchar. Vi-o engasgar-se no próprio
sangue…
Senti movimento atrás de mim e depois impacto contra a minha
cabeça, à medida que pedaços de madeira voam à minha volta. Tinham-me batido
com um caixote.
Levantei-me de um salto e olhei para os dois paspalhos; O
que me tinha acertado com o caixote, tinha recuado uns passos enquanto o outro
continuava parado em espanto.
Soltei um rosnar de irritação.
- Oh merda… - Disse o meu atacante. Rapidamente a minha mão
atravessou o seu peito, agarrei o coração que bombeava tresloucadamente e
puxei-o fora. O homem olhou para a minha mão com espanto crescente, levantei o
pé, empurrei-o e ele caiu morto no chão.
Os meus olhos focaram-se no outro que tinha começado a
correr e, assim do nada segui-o numa corrida, ao princípio lenta mas, logo depois
aumentei a velocidade.
Os humanos correm depressa quando guiados pelo medo e pelo
terror mas, não tão rápido para fugirem a uma vampira de mau humor. Assim que o
avistei, corri mais depressa e empurrei-o. O homem voou contra um caixote de
lixo, criando um barulho ensurdecedor…ainda tentou fugir chutado sacos de lixo
na minha direcção mas mesmo assim, não parei.
- Por favor…por favor… - Agachei-me à frente do homem de
olhos castanhos. - Por favor…Não me mate…
- Porquê?
- Tenho filhos…três…três filhos – dois rapazes e uma menina
– e uma esposa…a minha mulher…amo-a muito…por favor…
- Hum…Deixa-me ver… - Peguei-o pelo casaco e puxei a sua
carteira do bolso. Abri-a e, vi logo que mentia, enquanto passava os olhos pela
carteira vazia. - Uau! Deves amá-los muito para não teres nenhuma foto deles
aqui.
O seu coração batia descompassadamente, aumentando a minha
sede.
- Por favor…por favor…misericórdia…
Agarrei-o pelos cabelos e puxei-o para mim mais depressa.
- Lamento, mas hoje não estou misericordiosa.
Tinha bebido o sangue de três pessoas naquela noite e agora
eles estavam os três misturados voando pelas minhas veias. Sentia-me poderosa
como se pudesse enfrentar mil recém-nascidos e ainda mais mil. As estrelas
estavam mais brilhantes que nunca, o ar mais frio que antes e sentia-me com a
força de gigantes enquanto caminhava para casa.
Portanto, foi uma noite sangrenta mas, saciou-me a sede.
Deixei rasto de sangue e tripas pela rua mas, pronto ao menos amainou o meu mau
humor, ou assim julgo. Já estou à frente de casa, ponderando se devia ou não
entrar, sinceramente, não tenho muita vontade de entrar naquela confusão
novamente mas, tinha que tomar um banho…tinha sangue na cara, na minha roupa em
especial o corpete que, via-se que estava manchado em grande parte por um líquido
vermelho escuro, a minha mão direita estava toda vermelha…
Empurrei a porta com o pé, passei pelo nosso jardim interior
que, continuava com as flores mortas e a estátua da mulher ali no meio
parcialmente destruída. Entrei no hall, quase tropeçando no buraco deixado pelo
lustre que tinha caído a alguns dias atrás e subi as escadas que continuavam
com falhas. Mal cheguei ao corredor dei de caras com Beth no seu vestido branco
e cabelo negro.
- Beth, não é?
- Para alguns…
- Hum… - Olhei-a de cima abaixo. - E o que és?
- Uma bruxa. - Disse aquilo como se fosse motivo de orgulho.
- Uhh, há muito que não me dava com bruxas. - Lembrei-me de
Claire e Verónica mas, muito vagamente. Aproximei-me de Beth, observando-a de
cima abaixo; Okay, era bonita e tinha um ar de ser um perigo. - Diz-me, Beth, tens algum poder especial?
- Sim. Fogo. - De repente vi-me rodeada por um círculo de
fofo que se formou à minha volta. Sorri para Elisabeth. Boa, uma piromaníaca na
mansão. - Não necessitam de sair para o sol para se queimarem.
O fogo aumentou de intensidade.
- Diz-me, és o quê à Sheftu? Guardiã?
- Amiga.
- Oh! Palavra poderosa para usar com aquela loira
mumificada. - O fogo à minha volta intensificou-se e eu ri-me.
- Divertiste-te esta noite. - Disse olhando as minhas roupas
cobertas de sangue. - Coitados. Deixaste um rasto muito sangrento?
- Penso que sim. Provavelmente apareço nas notícias amanhã…
- Que pensa o teu humano disto?
Olhei para ela com
algum espanto. Não hesitei em sorrir, olhando para o fogo à minha volta.
Caminhei pelo meio das labaredas como se nada fosse, assim que as ultrapassei o
fogo desapareceu e li nos olhos de Elisabeth algum espanto. Passei por ela sem
lhe dar mais atenção, desferindo um pequeno encontrão e segui o meu caminho.
- Vai ser um prazer ter-te por cá, Beth. Mas, por favor… - Voltei-me
enquanto caminhava. - Não queimes a mobília.
Deixei-a com uma gargalhada louca. Meu Deus, como me sentia
poderosa e forte!
Ia entrar no meu quarto mas, vi a porta do quarto de Sheftu
aberta e para lá caminhei, vi-a sentada ao lado da cama de Eric, que permanecia
inconsciente e cuja pele tinha adquirido um tom esquisito. Sheftu, mal me viu,
saltou por cima da cama e empurrou-me contra a parede, prendeu-me os movimentos
mas, sinceramente, eu não me queria mexer.
- Olá, Sheftu!
- CALA-TE!
Abri um sorriso.
- Espera… Estás chateada?
- A culpa é tua!
- De quê, Shef?
- Do Eric estar como está!
- Humm… - Disse eu fingida. - Não me lembro de ter pedido ao
Eric para defender-me. Eu sabia que a sua atitude de macho alpha iria metê-lo em problemas um dia…
Apenas vi Sheftu a levantar a mão contra mim e a seguir o
impacto da bofetada, bem foi de tal modo forte que me desequilibrei e caí ao
chão. Senti o gosto do meu sangue na boca. Comecei-me a rir. A sério que comecei…
A porta do meu quarto abriu-se e vi dois pares de pernas:
Frankie e Dean.
Sheftu levantou-me do chão e voltou a encostar-me contra a
parede, tentei ficar séria mas, não conseguia.
- Viste o que eles fizeram ao Eric?
- Eu estava lá e repito: Eu não pedi a ajuda de ninguém, é o
que dá o Eric armar-se em… - Sheftu empurrou-me contra a parede com força,
senti-a rachar com o impacto. - Wow! Estás mesmo
chateada!
- A última coisa que precisamos é de desgraça nesta casa,
Carmen. Principalmente trazida por ti e pelo teu passado mal resolvido!
O meu sorriso desvaneceu-se, afastei Sheftu de mim e ela
recuou uns passos. Senti uma vontade de vomitar palavras e um acesso de raiva
tomou conta de mim.
- “Desgraça”? Falemos disso então! Quem foi que trouxe os
recém-nascidos para cá? Uh! A Pan! Porquê? Porque ela matar-te! Portanto, quem
começou a onda de desgraças aqui foste tu, múmia. - Empurrei Sheftu que recuou
para dentro do quarto. - Tivemos de ir até ao outro lado do mundo para ir
salvar esse teu couro ingrato do teu passado
mal resolvido!
- Nunca pedi que fossem buscar.
- Oh a sério? Então, volta para lá! VAI! Menos gente mais
espaço!
- Carmen, por favor… - Foi a vez de Frankie falar com a sua
voz calma. - Não se chateiem…
- Isto nada tem a ver comigo. O Eric está mal, Carmen! Por
causa do teu passado!
- O meu passado!? - Ela esqueceu-se do que aconteceu há dias
naquela casa e as marcas que ainda estão na biblioteca. O meu passado? - Queres que chore pelo Eric estar assim? Não me
lembro de ter pedido a sua ajuda! É bem feito, a ver se acorda e se mete no seu
lugar!
Sheftu puxou o punho atrás e desferiu-me um soco que fez-me
recuar. Senti mais sangue a acumular-se na minha boca, juntei e cuspi-lhe em
cima do seu vestido.
- Carmen, pára com isso! - Advertiu Dean.
Sheftu olhou para o vestido em choque, voltou para cima de
mim com toda a carga. Agarrou-me, levantou-me do chão e enterrou-me no soalho,
puxei a sua cabeça na minha direcção e dei-lhe uma cabeçada que fê-la recuar,
Mas, não por muito tempo. Sheftu voltou a carga agarrando-me pelo pescoço e
empurrando-me contra a parede novamente. Eu empurrei-a de volta e caí em cima
dela. Sheftu berrou, trocamos de posição e ela ficou por cima de mim, agarrou o
meu pescoço com uma mão.
- Estou prestes a partir-te o pescoço.
- Força. - Incentivei. - Mostra-me do que és capaz, Sheftu.
Ela riu-se. O seu aperto foi-se intensificando. Ela iria
matar-me e eu estava mais do que pronta mas, aí ela foi puxada.
- CHEGA! - Berrou Dean. Ele agarrava Sheftu pelos braços e
Frankie estendeu-me a mão para ajudar-me a levantar. Neguei a sua mão conseguia
levantar-me sozinha. - Chega, Carmen.
- Eu ouvi da primeira vez, Dean! - Respondi ameaçadoramente.
Olhei para Sheftu de cima abaixo e sorri.
- O QUE FOI?!
- Sabes, estou a pensar se, quando chegar a altura, vale
mesmo a pena salvar-te uma segunda vez.
Passei pelos três deixando aquela frase pairar. Estou farta
desta casa, estou farta dos seus ocupantes. Acabou-se a simpatia!
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