Transilvania Season - Ep 34, Sheftu

Agora que o fim de Henry se fazia cada vez mais próximo pelas mãos da sua própria criadora, Sheftu não conseguia deixar de se sentir culpada por isso. O dia traria cinzas e todas as horas que demorariam demasiado tempo a passar. Até quando a eternidade duraria?

"Last Breath" by Sheftu Nubia

Minhas mãos se mantinham firmes a cada traço que dava sobre o seu corpo, enfraquecendo-o lentamente, tornando a capacidade de cura mais demorada. Concentrava-me a cada movimento que dava, tentando não me recordar da razão pelo que eu o fazia.
Como se duma arte se tratasse, compondo a sinfonia que acabaria com a sua morte, eliminando assim o que eu tinha criado. Seu corpo transmitia a dor presente em cada novo movimento que eu dava sobre ele, controlava os seus espasmos, sem que demonstrasse realmente a dor que estaria a passar-se.
Seu sorriso percorria cada novo corte que dava, uma pele fria que se manchava de um líquido avermelhado, odores misturados das suas vítimas quase diluíam o seu real cheiro. Eu acreditava que parte daquele homem que tinha conhecido há séculos continuava vivo sobre aquele coração parado. E não estava enganada, o seu último desejo o dizia, em cada segundo que os meus dedos determinavam mais um passo para a sua morte final.
Eu compreendia o seu jeito de querer viver tudo isto, como se começasse o seu juízo final, condenado pelas suas decisões na vida e na morte. Seu sangue percorria todo o corpo, não faltaria muito tempo para que a manhã começasse. E aqui estava eu, ajoelhada sobre a terra, manchando-a do licor de uma morte por acabar, seguindo pelo destino que jamais desejara.
- Espera. – A sua voz saíra fraca, mas o meu pulso foi levemente agarrado pela sua mão ensanguentada.
Instintivamente voltei o meu olhar para o seu e arrependi-me rapidamente de tudo o que tinha acabado de fazer.
- Eu conheço esse olhar… - Afirmava ele, lentamente, tentando erguer a sua cabeça do chão mas sem muito sucesso. Minhas mãos rodearam-lhe o tronco com a maior suavidade possível e pousei-o sobre o meu braço esquerdo, ficando assim amparado sobre o meu peito. – Não deves ficar assim, eu o quis.
- A culpa é sempre minha. Se eu não… - Seu dedo aproximou-se dos meus lábios, sendo sugados, sentindo o seu sabor misturado sobre os aromas que nos rodeavam.
- Não tens que ficar por mim. Daqui a nada o sol ergue-se, deixa-me aqui e vai.
- Nem penses em tal coisa. – Disse eu rispidamente, continuando de uma forma mais suave. – O sol não me faz nada, devíamos era de te levar para longe daqui.
- Eu não faço intenções de sair de onde estou.
- Acredito que não esteja ao teu alcance manter a tua ideia.
- Talvez devesses respeitar o meu último desejo antes da minha morte. – Seus olhos se abriram prontos para investir em cada argumento que eu desse. – Estamos entendidos?
- Acredito que nem estejamos lá perto.
- O que importa é o que eu quero. E tu vais dar-mo, por tudo o que passamos juntos.
- Isso é um golpe baixo. – Acusei, engolindo as suas palavras a seco.
- Pode até ser… Mas é o que eu quero. Deixa-me aqui.
- Não o posso fazê-lo. – Neguei.
- Não me vais deixar seguir com o meu destino? – Continuava determinado, demasiado determinado para o meu gosto.
- Teimoso.
- Eu nunca disse que não o era. Vá, não mudes de tema… Vais ou não deixar-me seguir em frente? – Desviei o meu olhar, olhando para um outro lado qualquer. Necessitava de pensar, de descobrir alguma forma de tentar convencê-lo.
- Nem penses… - Disse-o, usando as suas fracas forças para aproximar novamente a minha cara da sua, controlando o gemido que saía da sua boca. – Vais ou não fazê-lo?
- Sim… - Respondi-lhe, baixando o meu olhar para o seu peito ensanguentado, perguntando-me o que raio estava eu a fazer… Minha mente gritava que não, berrava com todas as suas forças para que voltasse atrás.
- Não precisas de ficar assim… - Enxugava-me as bochechas, olhando com atenção, parecia preocupado com algo. – Agora vai, não quero ver-te desse jeito por minha causa. Eu fico bem.
- Não me parece que possas usar o ficar bem para isto.
- Não me importa.
- Não te vou deixar aqui sozinho, não quando queres fazer esta loucura. – Disse. – Afinal de contas eu é que te fiz, por isso és tu que me deves a mim obediência, não o contrário.
- Tens razão, Nubia. – O silêncio tornou-se enorme nos próximos minutos, até que o tempo passava e os primeiros raios de sol ameaçavam em aparecer.
Parte do sangue tinha ficado seco, apenas as sequelas mais profundas da tortura tinham permanecido, curando-se tão lentamente como se fosse realmente um humano. Sobre o silêncio passava o enorme desejo de arrancar-lhe esta ideia bárbara, obrigando-o a ingerir novamente o meu sangue, para que ficasse tudo como antes.
Mas… Quem era eu agora? O sol já nada me fazia, a cada nova aurora descobria novas e estranhas mudanças sobre o meu corpo, não podia correr o risco de lhe trazer as mesmas mudanças, para que se tornasse em algo que nem eu mesma sabia o que era.
Os primeiros raios de um sol demasiado vivo começavam a entrar em contacto com a sua pele, a reacção do seu corpo foi tentar afastar-se. Não por muito tempo, estávamos rodeados de nada, em que o dia podia surgir em todo o seu esplendor. Os seus gemidos finos começavam enquanto a sua pele adquiria um tom avermelhado, ganhando rapidamente bolhas, queimando vertiginosamente, até que as cinzas poderiam apoderar-se finalmente daquele local.
Observava horrorizada o momento em que seu corpo estrebuchava, desejando sombra, gritando desalmadamente por socorro. O pior erro que poderia fazer era olhá-lo e, para uma estupidez perfeita, eu o tinha feito… Seus olhos clementes chamavam-me, sobre os gemidos agoniantes e gritos que saíam da sua boca. Pensei em fazer algo, em ajuda-lo a esconder-se, para que conseguíssemos salvá-lo de alguma forma. Mas em breves segundos, toda esta tortura se tornara demasiado grave para que algo pudesse ser feito, a sua salvação não existia, seu ser estava completamente condenado.
Aproximei-me levemente da sua orelha, deixando que as palavras fluíssem da minha linha de pensamento, não sabia o que dizia ao certo, estava perdida algures sobre as emoções que me cercavam.
Os gemidos pararam, toda a agonia cessou. Tinha acabado, seu corpo continuava a despedaçar-se sobre o sol, mas sua mente tinha acabado por ceder. Aproximei-me da sua face, observei uma última vez aqueles seus olhos e senti os seus lábios mortos sobre os meus.
- Fica em paz, meu amigo. Fica em paz. – Abracei o que ainda restava dele, até que tudo acabasse por desmoronar. Apenas cinza e sangue estavam próximos de mim, e senti-me novamente vazia. Olhando para o infinito do nada, sentindo apenas o meu corpo lá, com o sol quente, com o vento que tentava derrubar-me, mas não. Eu estaria aqui.
                    
Sentia a pulsação de Kiya a aproximar-se e não vinha sozinha.
- Terei de te levar comigo. – Começou Kiya por dizer, seu tom confiante me lembrara de algo.
Todo e qualquer elemento do castelo que aniquilasse um vampiro seriam torturados até à morte, não importando a razão pela qual o fez.
Era um plano perfeito para ela, deixar-me à disposição da vontade de morrer daquele que eu criara. Henry tinha sido o meu passaporte para as catacumbas, não que me importasse muito com isso neste momento...
- Segue em frente, faz o que tens a fazer.
Tão rapidamente quanto eu tinha falado, inseriu sobre a minha pele uma picada fina. Sentia a sensação mais uma vez, o sangue que pulsava sobre as articulações, espalhando-se rapidamente e dando o resultado final: pouco depois estaria completamente apagada.

Meu corpo sentia uma enorme pressão, como se algo ou alguém me abraçasse. Por breves momentos permaneci ainda quieta, enquanto uns dedos percorriam as minhas costas, pressionando-me para mais perto. Na minha mente apenas existiam pensamentos de raiva, angústia, pressão e… desejo.
Não demorou muito até que o desejo se sobrepôs sobre todas as outras coisas, suspirando pesadamente sobre o corpo que começava a reagir demasiado bem para o meu gosto. Não sabia porquê, mas esta tentadora hora estava a torturar-me por completo, tortura geladamente deliciosa.
Todos os meus sentidos se sentiam mais apurados que antes, sobre as pontas dos meus dedos que circulavam sobre aquela pele fria, um cheiro que se entranhava sobre os meus pulmões, revoltando-me, intrigando-me… Não queria ver a sua face, desprezava qualquer pensamento que o desejo me desse, espezinhava qualquer empatia por aquele corpo.
Aos poucos e poucos a minha mente cedia, em todo o meu interior gritava para que as acções cessassem, mas os instintos não mais me ouviam sobre aqueles lábios que reclamavam por tréguas. Meus movimentos o afirmavam, minha mente o negava.
Minhas presas circundavam o seu peito, cravado de uma marca grande, escura para o tom da sua pele, até que apenas num golpe as sensações se aprofundavam pelo líquido que passava sobre toda a minha boca. Irritantemente deliciava-me no sabor que tanto repudiava, sem que nada realmente pudesse fazer, em que a mente permanecia fraca, perdendo-se algures pelo momento. Suja, intragável e insaciável dor que me percorria.

Senti umas pressões por todo o meu corpo, as imagens e pensamentos esvoaçavam-se. Entregava-me agora à realidade, a velocidade era estonteante, sentia pressões intensas sobre mim, sangue que escorria sobre a minha face, com o meu sabor próprio, desamparada algures entre a realidade e o momento anterior… Deixei-me ficar… Que o destino sopre sobre a minha morte. Vem, vem e faz o que tens a fazer.

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