Transilvania Season - Ep 28, Sheftu

Já não bastava todo o passado que se fazia vivo, ao estar no velho castelo onde fora transformada, junto de sua querida e adorada irmã que a queria era verdadeiramente morta. Agora, só mais uma vez, o passado voltava - de um lugar bem morto da sua memória - e assombrava-a bem mais do que o habitual. Quem seria desta vez?

"Broken World" by Sheftu Nubia

Mais uma vez se comprovava a importância que a minha morte tinha perante todas estas mudanças. Não sabia quem eu realmente era agora. O que fui era simples, prático e puramente entusiasmante.
Apenas me lembrava de Kiya usar uma das misturas da Pan, aquela cabra que tinha sucumbido sobre as minhas mãos, apagando por completo pouco tempo depois. A consciência que tinha perdido parecia agora voltar para mim, demorei uns momentos até saber ao certo por onde eu andava.
Sentia ao longe uma pulsação que permanecia eufórica, como se brincasse com o momento que agora se atravessava à minha frente. O sol aquecia-me a pele, o sangue que circulava sobre as minhas veias permanecia ardente, como se houvesse algo que o fazia pulsar com mais felicidade, com mais vontade...
Pelo que me lembrava dos momentos em que perdi o meu tempo por aqui neste castelo, esta seria a zona humana... Tinha de haver alguma razão para que ela me tivesse trazido para aqui, talvez necessitasse de algo que lhe faltava para que não existisse mais nenhuma razão para que toda a corte seguisse as ordens de Gustav, mantendo-me como sua protegida. E eu não iria desfazer esse prazer, se ela o desejava então que o tivesse.
Eu não estava sozinha, à minha volta vários humanos permaneciam na sua vida medíocre, criando uma vasta gama de alimentos que serviria para alimentar toda esta geração. Mas o que era mais curioso era o nível de desenvolvimento que detinham, resgatando-me para uma outra época.
Uma secção de ratos de laboratório, seguindo à risca todos os costumes de um outro tempo, sem saber ao certo o que se espreitava nesta nova era que para eles simplesmente era a mesma. Não sentiam-se temerosos com a minha presença, o que me fez estranhar e observar-me. Claro que permanecia invisível, tal como se fosse uma deles, sempre ao sol, trajada com as suas roupas de lavoura e mantida em cativeiro. Apesar de que eles não tinham a mínima consciência de que se tornariam simples comida ou fonte de prazer para o amo deles.
- És nova por aqui? – Disse alguém, sorrindo alegremente ao ver-me.
- Talvez o seja. E tu quem és?
- Talvez se me observasses pudesses saber quem eu sou. – Dizendo isto, começou a dirigir-se para um outro local qualquer. Mas o meu olhar permanecia cativo naquele carro, não daria qualquer hipótese que alguém me vigiasse, que me usassem como bem lhe entendiam... E muito menos a minha própria irmã.
Surpreendeu-me vê-la a abrir o vidro do carro, sorridente, e acenando para mim para que eu continuasse a seguir o meu caminho. Hum... Estranho. Queria descobrir todas as razões que me levavam aqui, só que as respostas nunca mais chegavam, até que senti que uma enorme quantidade de sangue que se dirigia do meu lado direito.
- Vem… - Disse ele, soltando o corpo de uma camponesa que tinha sido brutalmente assassinada por aquela coisa. Eu aproximei-me, observando aqueles seus olhos verdes, sentindo o mesmo que no passado poderia ter-me incomodado, mas desta vez havia algo diferente, não me importava mais... O tempo tinha curado muita coisa, e talvez aquela fosse a hora de dizer adeus às memórias que permaneciam junto a mim.
- O que fazes? - Perguntei-lhe, fazendo-o sorrir e passar a sua mão ensanguentada sobre o meu cabelo.
- Não o consegues sentir a fluir sobre ti?
Ergui a minha cabeça para a lua e fechei o meu olhar para sentir, para viver aquele momento... O perfume que impregnava o meu cabelo era-me conhecido, a minha memória dessa altura tinha sido bastante agravada quando me limitei a impedir que minha mente se recordasse...
Inspirei profundamente, ao toque daquele que passava o sangue sobre as minhas mãos, sobre o meu cabelo, sobre os meus lábios para que sentisse o seu sabor. E recordei-me da escolha que fizera quando o transformara para juntar-se a mim.

Era uma noite simplesmente perfeita sobre as ruas de Amesterdão, ainda era demasiado novo para que conseguisse sentir toda a sua grandiosidade, apenas o sangue lhe importava no momento.
Seguimos para um bar qualquer, um casal que estava sentado à beira da janela chamou-lhe à atenção e rapidamente seguimos os dois para o nosso banquete noturno.
- Boas noites... Poderemos acompanhar-vos? – O som da sua voz que para mim parecia completamente vulgar encadeou aqueles dois com bastante rapidez.
- Estás a melhorar... Gosto disso. – Respondi-lhe eu sem que aqueles dois me pudessem ouvir, indicando-nos a sua permissão para que a morte os atravessasse.
- Tenho uma boa professora. – Refutou-me, sorrindo agora para aqueles dois e encadeando uma saída vulgar para que ninguém desconfiasse...
Henry tinha sido gerado na família que rapidamente tomou como seu próprio prazer a vontade de me aniquilar. Há várias gerações que começaram a caçar-me sem grandes sucessos. Porém houve um que acabou por captar a minha atenção, não pela vontade de dar termo à minha morte. Ele desejava muito mais do que uma simples vingança... Fascinava-o a capacidade de tortura que alguns da nossa espécie conseguiram ao longo dos anos ter. A perfeição não fazia parte desses momentos bárbaros, para ele tudo simplesmente era o prazer em si.
Foram apenas uns dois centenários de destruição que passamos juntos, rapidamente a sua sede por destruição foi aclamada pelas famílias de caçadores de todo o mundo, criando-nos como um belo alvo para seres experientes e determinados na caçada. Foram duas mortes que se separaram, várias vidas que se chacinaram e outras histórias que ainda hoje ficaram na memória...

- Que fazes aqui? – Perguntei-lhe eu, apanhando a foucinha que ele me acabara de atirar.
- Acredito que tenha sido estupidez minha... – Começou ele por dizer, ficando por uns tempos em silêncio a observar-me. – Gustav acabou por vir procurar-me, tentando convencer-me ajudá-lo.
Seu olhar voltou-se para o chão onde tinha o corpo da camponesa, não tinha existido qualquer medo, nem fúria... Simplesmente aquelas pessoas iam seguindo as suas vidas sem que nenhuma fosse realmente ‘viva’.
- O que acabaste por fazer para parar aqui? – Perguntei-lhe sem rodeios, ele já sabia como as coisas eram, que ter sido transformado por mim lhe traria sempre demasiados problemas para ser-se morto pela eternidade. Mesmo assim desejou-o, entregou-se por completo à sua nova demanda e seguiu-a como ninguém. Pensei que talvez estivesse morto, apanhado por algum caçador que nos procurava, e eu nunca estive tão enganada na eternidade... Tal como nunca estive tão contente por ter errado.
- Uma súbdita desse idiota convenceu-me a vir até aqui, como se alguma vez pudesses ter sido apanhada! – Mas rapidamente rectificou o que acabara de dizer com o olhar. Sim, eu tinha acabado de ser apanhada.
- E então porque permaneces por cá?
- Aquela cabra usou magia para me manter cá. – O ódio surgiu no seu olhar e um sorriso enorme cravou-se na sua cara. – Mas eu já tratei de lhe dar a morte que merece!
Eu sorri, por pouco que podia imaginar o que aquela mulher tinha passado. Henry sempre tivera demasiada imaginação nessas horas, por isso nunca se decidia por qual ideia usar, ficando assim toda a cadeia de tortura alargada o mais possível para que pudesse usar tudo.
- Qual a forma de quebrar esse feitiço?
- Não sei ao certo... – Disse ele, continuando a abrir a goela de mais uma das camponesas. – Sei que está aqui algures a resposta, que o sangue é o que me permitirá sair daqui.
- O sangue?
- Sim, pelo que consegui tirar daquela maldita bruxa. – Escarneceu.
- Mas como?

- Eu...não...sei.

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