Transilvania Season - Ep 23, Elizabeth

Por mais anos que esta nossa bruxa pudesse ter vivido, Beth nunca imaginaria que pudesse sentir-se tão chegada àquela loira que aparecera num dia destes como refém de Gustav. Tinham algo bastante básico em comum: as suas torturas nunca perdiam significado, nunca deixavam de ser profundamente delas. Mas muito mais estaria para vir, estaria Beth pronta para tudo isso?

"New Side" by Elizabeth Wood


Ela estava ali, a escassos centímetros de distância, mas eu não tentei fazer-lhe mal. Não só porque sabia ser em vão como porque gostava do que estava a ver. Pan, Pan a sofrer terrivelmente. Angustiada e amedrontada. Eu não tinha nada contra Pan, pelo menos nada de especial, mas se fora aquela que escolhera como a minha forma de vingança, por mais sádica e desonesta que esta fosse, deixá-la-ia actuar. Queria lá saber se Gustav me considerava uma traidora. Mais despeitada do que ele estava eu de certeza.
 Então, enquanto me deleitava com o corpo moribundo caído no chão, reparei que ela me olhava.
 - Desculpa se interrompi algo. Não era a minha intenção – O meu olhar fascinado tremeluzia entre ela, feroz e um tudo nada ofegante, e Pan, coberta de sangue e prestes a morrer. Soltei um curto sorriso de triunfo. Gustav tinha um certo apreço por Pan, ainda que este não se elevasse por ai além. Um golpe é um golpe, por menos importância que tivesse para ele.
 - Não tem qualquer importância – Respondeu, mas eu contrapus:
 - Claro que tem… - Levantei a mão para interromper, e fiz um breve trejeito na direcção do corpo caído – Não queres acabar o que começas-te?
 - Sim, claro… Nada me agradaria mais. – Perguntava-me o que é que Pan teria feito para lhe suscitar tal raiva… Ela parecia satisfeita com o que eu lhe dissera, e eu estava fugazmente feliz por descobrir que partilhava mais com o meu inimigo e possível fonte de vingança do que inicialmente pensara… Talvez ela se tornasse mais importante do que aquilo que eu planeava… Talvez até lhe pudesse chamar aliada. Mas não amiga. Amigos eram uma coisa que eu não tinha.
 Então, para lhe mostrar o quão agradada estava com o seu gesto, contornei-a e agarrei Pan pelos braços, erguendo-a. Sabia que poderia tê-lo feito com uma simples palavra, mas não me pareceu tão significativo se eu não tivesse de fazer um esforço mínimo – embora, obviamente, eu não estivesse a fazer esforço nenhum.
 - Como vês, afinal existem coisas que nunca mudam – Começou Sheftu, colocando a mão sobre o peito, sobre o coração que parecia vibrar em vez de bater. Teria de ser rápida se a queria fazer sofrer. Pan não tardaria a sucumbir por si própria – O teu coração impuro terá o seu devido lugar. Agora, morre!
 Foi estrondosamente emocionante ver o coração de Pan bater pela última vez na mão daquela mulher. No entanto, algo pareceu não correr bem. A respiração de Sheftu ficou, subitamente, ofegante. Ela tremeu ligeiramente e caiu, mal me dando tempo para a amparar com as minhas próprias mãos.
 Entretanto, chegou outra mulher. Eu conhecia-a como sendo uma das escravas de Gustav. Uma humana. Bah! Não tinha a certeza do seu nome, mas acho que teria algo que ver com Donna ou Dora.
 - Ela está bem? – Perguntou ela, acorrendo para nós. Lancei-lhe um olhar furibundo, e ela estremeceu sob o seu peso. No entanto, parecia ser mais fiel a Sheftu do que ciente do risco que corria, pois caminhou na nossa direcção, ainda que hesitante, e prostrou-se ao lado do corpo inconsciente de Sheftu. Mas que raio…?
 - Está óptima – Respondi, ainda ligeiramente curiosa. Mas depois tornei-me fria – E o que fazes tu aqui?
 Ela baixou a cabeça como se temesse que eu tivesse um ataque e lhe arrancasse.
 - Tenho de estar aqui. Com ela – Esclareceu. Não perguntei mais nada, mas continuei a fitá-la enquanto ela olhava ansiosamente para Sheftu. Preparei-me para falar, para quebrar o silêncio demasiado confortável que se instalara, mas os olhos de Sheftu abriram-se e ela levantou-se.
 - Calma… - Agarrei-lhe o braço, com medo que caísse.
 - O que aconteceu? – Perguntou.
 - Depois daquela tua festa privada, não sei como mas foste abaixo… - Sorri com a simples lembrança do coração arrancado, do peito furado… Mas depois surpreendi-me a mim mesma quando percebi que ficara preocupada.
 - Quando chegará a hora? – Interrogou, surpreendendo-me com o facto de ser tão fria no que tocava à sua própria morte… Ou destruição, visto que morta já ela estava.
 - Acredito que tudo está a ser preparado o mais rapidamente possível por Kiya – A sua expressão alterou-se, como se o nome lhe dissesse mais do que aquilo que devia, mas como não a consegui desvendar, continuei – Ela está determinada a tratar do assunto o mais rápido possível.
 - Calculo que sim… - Matutou, mais para ela do que para mim.
 Então, a humana aproximou-se dela, esticando os braços na sua direcção e mantendo a cabeça baixa.
 - Não precisas de me devolver isso. – Disse Sheftu.
 Então, eu olhei para as suas mãos com a devida atenção, e lá estava ela. A pulseira negra. Aquilo que lhe daria protecção absoluta. Podia ter morto Sheftu há segundos, ou até mesmo agora, e a súbita coragem da mulher ficara mais clara para mim, de repente. Se eu matasse Sheftu, a minha vingança seria ainda mais dolorosa, pois conseguia reconhecer que Gustav lhe tinha especial devoção… Mas não me arrependia, pois começara a ver em Sheftu algo diferente, igual a mim, e isso agradava-me.
  - Mas, Senhora... Sei que precisa disto mais que eu. – Replicou Dora. Arranquei-lhe a pulseira das mãos e depositei-a nas de Sheftu, fechando-as.
 - Não me vás agradecer. Acredita que faço mais um favor a mim do que a ti. Aceita, vais precisar. – Disse.
 Com um gesto, mandei a humana sair, o que ela fez obedientemente. Agora que já não tinha aquela pulseira, o medo que nutria por mim parecia levar a melhor sobre ela. Sheftu sentou-se.
 Nenhuma das duas falou, até que ela se levantou e saiu do quarto… Ou sairia, se os guardas à porta o tivessem permitido.
 - Gustav está a fazer os possíveis para que não sejas julgada… - Proclamei, e silenciei ao ver a sua expressão.
  - Achei curioso… - Principiei, depois de longos momentos de silêncio.
 - Curioso o quê? – Interrogou.
 - A forma como matas-te aquela coisa… - Sorri e ela retribui-me o acto - É habitual seres assim tão... Tempestiva com a humanidade?
 - Tem dias… E também tem gostos.
 - Para mim qualquer humano é digno de sofrer – Mas calei-me, pois Kiya entrara no quarto e dirigia-se a mim.
 - Gustav necessita de ti – Afirmou. A recordação da noite anterior assolou-me o espírito, visível na sua expressão de amuo e desafio. Então, fiz com que algumas palavras esvoaçassem até a sua mente. «Dormis-te bem ontem à noite?» Ela olhou ferozmente durante instantes, enquanto eu saia do quarto, mas voltou de novo para Sheftu.
 Gustav… Não me parecia que fossemos tão próximos depois daquele dia. Mas, enquanto não soubesse o que fazer, segui-lo-ia.
 Gustav estava sentado no seu quarto, numa grande almofada roxa feita de penas suaves e com bordas douradas.
 - Que queres? – Atirei rudemente.
 - Elizabeth, minha querida, não podes esconder os teus ressentimentos? Ou antes apagá-los? Estou a sofrer bastante com os últimos acontecimentos.
 Não respondi, ao que ele suspirou.
 - Muito bem… O castelo está em grande alvoroço. Eu sou a entidade superior aqui dentro, mas eles não me querem ouvir, Exigem um julgamento. Tive de desviar todo o grupo da Copenhaga para o Norte, e encontrar-nos-emos dentro em breve, quando formos resolver os nossos problemas. Preciso de ajuda urgente para governar o castelo! Ajuda-me, Elizabeth. Por favor! Obriga-os a ouvir!
 - Quando é que partimos?
 - Hoje à noite o mais tardar, mas receio que façam mal a Sheftu na minha ausência. Poderias, pelo menos, enfeitiçar os seus aposentos? Ou o local onde se encontra?
 Suspirei Teria de me render às suas súplicas infantis, embora soubesse que a pulseira se encontrava na posse de Sheftu.
 - Queres um enorme dor de cabeça, uma falsa explosão ou apenas um aviso? – Perguntei.
 - Um aviso bastará. Aqueles que acaso se lembrem de lhe tocar sofrerão as consequências mais tarde.
 Virei-me para sair, e ele acrescentou.
 - Beth, faz os possíveis para que ela não se aperceba.
 Acenei e deslizei porta fora, na direcção do meu quarto.
 Se o novo grupo ia para o norte, teriam de ser ensinados, e essa era a minha tarefa. Peguei nos diversos livros manuscritos (devidamente encantados para não se incendiarem nas minhas explosões de raiva) e enfiei-os num enorme malão negro, assim como alguns pares de calças e roupas mais modernas. Gustav sempre pedira aos seus servos que mantivessem o estilo adequado ao ambiente.
 - O que é que achas? «Tocas-lhe e morres» para quem se lembrar de lhe tocar ou «Eu não te aconselho»?
 - Como é que sabias que estava aqui? – Perguntou Celine, transformando-se.
 Não levantei o olhar das folhas quando lhe respondi.
 - Ouvi-te, pressenti-te e cheirei-te – Franzi o nariz – Podes responder-me?
 - Hum… Acho que a segunda, «Eu não te aconselho» é melhor. Assusta mais. Não te esqueças de imitar o tom de voz dele.
 - Claro. – Murmurei, apressando-me a murmurar o encantamento necessário.
 - Então, preparada para umas férias em conjunto? – O tom dela era falsamente espevitado. Congelei.

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