Inverness Season - Ep 39, Carmen

Para variar um pouco, o passado voltava a assombrá-la e tudo por causa de Lawrence. Porque teria ele lhe devolvido o diário que tantas memórias lhe traz? O que teria ela de enfrentar agora? Já não era o bastante? Não imaginava ela que estranhas alianças se faziam mesmo debaixo do seu nariz!

“Damn ir, you and all your tricks!” by Carmen Montenegro


Desci as escadas rapidamente, apenas tinha em mente aquele presente que Lawrence fizera questão de me dar. Atormentava ainda a minha consciência, era como se o passado chamasse por mim a altos berros.
Não precisava ser nenhum geniozinho, sabia perfeitamente onde Lawrence estava. Fui, instintivamente, levada para a biblioteca; Abri as portas de rompante, ali o silêncio reinava mas, sentia Lawrence ali por perto. Fechei as portas de mansinho, assim que ouvi o trinco, avancei para o centro da biblioteca, levava o meu presente entre mãos, larguei-o em cima da mesa com um estrondo.
Não gostaste da prenda? - A sua voz ecoou pelas paredes de vidro, da biblioteca. Era com se ele estivesse em todo o lado. - Presumo que não.
- Quero uma explicação! Como arranjaste isto, para quê que mo deste e o que raio se passa, Lawrence? Sem meias palavras, sem explicações filosóficas apenas a verdade. Simplesmente.
Ouviu-o suspirar.
Não podes simplesmente aceitar?
- Sabes uma coisa...recuso-me a falar com uma voz!
Lawrence apareceu por detrás de uma estante, com o livro na mão. Enquanto, andava para mim, deixou-o em cima da prateleira.
- Estou a tentar ajudar-te.
- Ajudar-me? Devolvendo de novo um pesado pedaço de quem fui? Para quê? Enlouquecer-me?
- O que foi que eu te dei? Obviamente, não sabes! Eu sei o que te dei mas, tu pareces não saber, porque caso soubesses não estavas a perguntar quando a resposta é mais do que obvia. - Não disse nada, agora era a sua vez de se explicar. - Dei-te um caderno. É um caderno qualquer?
- Não.
- E o que está escrito naquele caderno? Poemas, histórias, o dia-a-dia?
- Não. Estão registadas todas as minhas caçadas. Tudo o que alguma vez cacei está ali registado.
- Exacto. Os rastos, como se movem, os esconderijos, o modo de agirem, como são, o que são, o que fazem...tudo está ali.
- Porquê? Porquê que me deste o meu Caderno e onde foi que o arranjaste?
- Como o arranjei não interessa...- Lawrence caminhou até mim, diminuindo o espaço entre nós. - Apenas quero que te lembres, como agias quando eras caçadora, porque vais precisar desses conhecimentos, novamente. Achas que to daria, apenas por dar? Achas que te quero torturar? A tua mente é algo maravilhoso, Carmen. Tu mesmo disseste-me, várias vezes que tinhas flashbacks da tua vida humana...
- Mas, nada detalhado, Lawrence.
- Eu sei, isso significa apenas uma coisa: são sinais! A tua memória humana, está ai, está presente mas, apenas adormecida. A cada lembrança é um espasmo.
- Não fazes sentido.
- Apenas precisas de um empurrão, um incentivo – como o caderno que te trouxe – e lembraste de tudo. E, aposto que até te sentirás melhor contigo mesma quando aceitares que podes ser caçadora e vampira. Pensa nisto como uma ligação sobre quem foste e quem és. - Eu não me mexi. Aquilo fazia algum sentido e, acabar com a minha guerra pessoal era sempre bom. Olhei para Lawrence, provavelmente com o olhar mais confuso de sempre, e vi-o expectante. - Não te quero fazer mal. O teu bem está no topo da minha lista, quer seja com o tonto do Eric ou com o impulsivo que é o Dean...
Fiquei estática. Lawrence sabia?
“Não sou idiota, Carmen. Para além disso, tens o cheiro dele em ti. Por isso, se o queres proteger, isto equivale tanto para o humano como para os outros seres sobrenaturais desta casa, sugiro que pegues no teu caderno e estudes ou melhor, relembres todos os teus casos. - Lawrence passou voltou-se para trás, aproximou-se da estante agarrou no seu Fausto e voltou-se para a porta. Abriu-as ao mesmo tempo mas, antes de sair voltou-se para mim. - A propósito, vê debaixo da mesa.
E, fechou a porta. Deixando-me sozinha na biblioteca, completamente desnorteada com todas aquelas revelações: Teria que voltar ao meu Caderno, teria que voltar a estudar todos os meus casos? E porquê que Lawrence tinha a mania de me dar a informação as prestações.
Voltei-me para a mesa, avancei e agachei-me. Reconheci logo o objecto, era a minha mochila; Abri-a e lá dentro vi as minhas Desert Eagle.
- Mas que... – Tirei uma, retirei o carregador e vi-o cheio de balas. - Lawrence! 
Corri para a porta, abri-a de rompante mas, não o vi. Tinha desaparecido, novamente aquela criatura estranha!
Ao contrário bati de frente com um aroma já meu conhecido. Vinha de algures perto dali. Mas, que raio está ele aqui a fazer?
Abandonei a biblioteca, caminhei seguindo aquele aroma até que comecei a ouvir vozes conhecidas. Avancei com todo o cuidado, até que ao virar a esquina encontrei Dean e Frankie numa conversa cerrada. Fiquei ali parada a ouvi-los sussurrar, nem prestei atenção ao que estava a ser dito apenas, fiquei ali. Não tardou até Frankie, parar de falar e o seu olhar cravar-se em mim, Dean de costas não disse nada, apenas vi-o a soltar um gigantesco suspiro.
- Carmen! - Exclamou Frankie com um entusiasmo bem falso. - Como estás?
Não respondi ao princípio, apenas permaneci ali com os braços cruzados e o ar mais lixado que alguma vez fizera. Então, Dean voltou-se. Trazia roupa diferente, apenas umas calças pretas com uma sweatshirt preta que marcava bem a sua bela aparência física.
- Olá...
Continuei a encará-lo com veemência, e apesar de não desviar o olhar, vi que Dean estava desconfortável pois tinha feito asneira da grossa. Desviei o olhar de Dean e encarei Frankie que coçou a cabeça sob o meu intenso mirar.
- Olá, Frankie...- Disse numa voz baixa. - Que fazes aqui?
Frankie olhou para Dean à procura de resposta, o seu primo devolveu um olhar cheio de cumplicidade.
- Ah, então chamas-te Frankie... – Ouvi uma voz mais do que familiar a aproximar-se. Voltei-me para trás já sem saber o que pensar daquilo tudo. Vi Sheftu a aproximar-se com toda a confiança do mundo e com um sorriso para os dois humanos. O que mais que espantou, nem foi o facto de ela ter aparecido mas, sim o súbito a vontade de Dean quando Sheftu se juntou a nós. Dean, desviou o olhar para o primo, sem olhar para mim que estava mesmo a sua frente ao lado de Sheftu. Evitava-me.
- Sim, ele é o Frankie. Frankie, ela é a vampira de que te falei... – Disse Dean.
- Mas porque é que andas a falar da Sheftu ao Frankie? – Perguntei com um tom mais de irritação do que curiosidade.
- Bem, isso agora não importa... – Respondeu Sheftu com um leve sorriso, convidando Frankie a segui-la. – Vamos?
- Não espero eu outra coisa... – Frankie piscou-me o olho como se tentasse atenuar a sua falha para comigo e depois, olhou para o seu primo com um ar mais de “Boa sorte, Dean”. Passou por mim e parou junto a Sheftu, cuja presença ali permanecia um enigma.
- Dean, ficas encarregue de manter entretida a menina Montenegro.
- Com todo o gosto e prazer... – Respondeu-lhe sorridente, antes do seu olhar cair sobre mim e o seu sorriso desaparecer. Vi-o a cerrar o maxilar. – Tentarei aguentar a fera o máximo que puder...
- Faz isso... – Sheftu voltou-se para Frankie, fez-lhe sinal para que ele a seguisse. – Vem, é por aqui...
Ambos esperamos até Sheftu e Frankie, estarem distantes o suficiente. Eles iam para a biblioteca, conseguia sentir o coração de Frankie a percorrer o mesmo corredor que eu tinha percorrido. Voltei-me para Dean que não se mexera.
  - Fera? - Perguntei num tom baixo e nada contente.
  - No bom sentido. - Desculpou-se ele com o ar mais natural possível.
  - O que se passa?
  - Nada.
  - Nada? Caso fosse “nada” não estarias com um ar tão culpado.
  - Não posso dizer.
  - Porquê?
  - Prometi à Sheftu?
O QUÊ?!
  - Prometeste...à Sheftu... – Peguei no meu cabelo e torci-o, atirando-o para trás das costas. Dean moveu-se também, pondo as mãos nos bolsos. - Desde quando é que andas a fazer promessas a Sheftu?
- Não é nada do que pensas!
- Não me deixas margem para pensar outra coisa, Dean!
- Lembraste quando o Eric apareceu no teu quarto...que tu querias que eu saltasse da janela...?
- Sim!
- Quando me levaste pelo corredor...havia uma porta...empurraste-me lá para dentro! Pois, a porta pertencia ao quarto da Sheftu... Portanto, tecnicamente a culpa é tua...
Mal acabou de dizer a frase, Dean mordeu o lábio. Eu sorri de irritação, voltei a torcer o cabelo e coloquei as mãos a cintura.
  - Oh é minha...- Voltei as costas ao humano e preparei-me para voltar para a biblioteca, quando Dean meteu-se a minha frente.
    - Carmen, por favor...
Avancei para ele, enquanto isso o meu querido humano recuava passo ante passo até ficar contra a parede. Via-se encurralado, o seu coração começou a bater com força mas, não de medo mas de excitação. Aproximei a minha boca da sua, levando com a sua respiração quente, a minha mão parou no seu peito, desceu barriga abaixo...
 Senti-o a tremer sobre a minha carícia, estava rendido apenas com um toque. Agora era ele que aproximava a sua boca da minha, eu avancei também mas, não para o beijar...
 - Estás em problemas... – Afirmei. Dei-lhe um empurrão mais forte contra a parede e desatei a correr para a biblioteca. Deixei Dean ficar para trás, pude ouvi-lo a praguejar contra si mesmo.
Fui pelo mesmo corredor que tinha percorrido a momentos, não corria mas, andava muito depressa. Não sentia Dean atrás de mim, deveria ainda estar a tentar acalmar-se.
Apenas ouvi uma frase mas, foi o suficiente para captar a minha atenção.
 É necessário ter bastante cuidado pois as defesas são apertadas por lá... Não quero que ninguém se magoe com a situação... – Entrei abruptamente biblioteca a dentro a passo rápido.
Querias respostas e queria-as agora!
  - Magoar com o quê? E onde?
  - Não é da tua conta. - Respondeu Sheftu.
Trocamos olhares intensos, nenhuma de nós iria desistir. Por mim, tudo bem a eternidade servia perfeitamente para discutir. Finalmente, Dean aproximou-se, vi-o a entrar pelo canto do meu olho; Estava meio corado, pulsação aos saltos e, claramente aborrecido por ter perdido o controlo há momentos. Não me resistia e ele bem sabia.
 - Desculpa, ao consegui impedir mais...
Ele acabou de pedir desculpa a Sheftu!?
 - Não tens que pedir desculpa, Dean! - Mas, que porra! - Então Sheftu, vais dizer-me ou não o que andam todos vocês a tramar?
Silêncio total. Olhei para Frankie mas, este desviou o olhar mal me viu. Olhei para Dean e ele também não me dera resposta nenhuma, tinha o olhar preso nas paredes de vidro da biblioteca. Sheftu, sentada numa poltrona continuava impassível.
Ia perguntar novamente, talvez até ameaçar, quando o coração de Dean alterou o seu ritmo.
 - Mas o que é aquilo?
Segui a direcção do olhar de Dean e fiquei sem qualquer reacção. Lá fora, aparecendo um a um por entre as árvores, vinham várias pessoas, todas vestidas de negro e todos carecas, donos de uma palidez fora do comum. Não tinham pulsação, nem cheiro, nem nada: Eram mortos. Os seus olhos vermelhos mostravam raiva mesmo de longe. Iam aparecendo uns atrás dos outros, passando para mais de 20 em menos de segundos.
No meio deles, também de preto mas, facilmente reconhecível vinha uma mulher: Os seus cabelos estavam apanhados, mas aqueles olhos verdes cobra ainda brilhavam malevolamente.
   - Pan? – Sim, era ela. Com um vestido preto de gola alta sob um casaco pesado até aos pés com uma mala nas mãos. Mal me viu mostrou o seu sorriso maléfico.
   - Conheces a Pan? – Perguntou Frankie surpreso. Nem respondi. O número dos nossos atacantes parecia ter parado nos 40. Quarenta seres mortos, rodeando as paredes a biblioteca numa tensão sem qualquer comparação, permaneciam imóveis, como estátuas de pedra maléficas a espera de uma ordem. A espera do comando de Pan.
 - Ela está a dirigir-se para nós na frente de toda aquela multidão. - Assegurei a mim mesma. - Cobra venenosa...
Encarei aquela mulher miserável e má no meio daquela gente, notei que sorria levemente; Sentia-se vencedora e ainda nem lhe tinha acentado a mão.
Sheftu olhava para mim, com apenas uma certeza no seu olhar.
 - Primeiro nós. – Afirmou-me.
 - Primeiro nós. – Concordei. Antes de sairmos em frente, olhei para Dean. - Fiquem aqui.
Eles entenderam e deixaram-se ficar apesar de estarem sempre alerta ao mínimo movimento. Não queria vê-los magoados, quanto mais longe melhor.
Abrimos a janela, e avançamos para o meio da multidão, o único som eram as folhas sob os nossos pés. Pan permanecia quieta e o resto também, aguardavam ordens daquele verme. Só me apetecia arrancar-lhe aquele sorriso a chapada!
  - Ao que vieste? – Perguntou Sheftu já suficientemente perto.
Pan largou um suspiro dramático, olhou em volta e sorriu.
  - Vocês já devem calcular ao que vim...
- Sabes que é um pouco ridículo esse teu momento? – Disse confiante. Na verdade, tinha todos os meus sentidos alerta: prestava atenção em Dean e Frankie na biblioteca, em Pan e a sua arrogância, nas estátuas a nossa volta e em Sheftu mesmo ao lado. 
-  Não tem importância... Vim cá para ter o que desejo. – Assentou Pan.
-  E isso é... – Perguntou Sheftu, pronta para o mínimo desaforo.
- A vossa morte, o que deveria de ser?
A ordem tinha sido dada, as estátuas maléficas a nossa volta ganharam vida e avançavam para nós. Uma batalha a ser travada no novo chão da nossa casa, eu e Sheftu estávamos preparadas. Ou eles ou nós.

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