Moscow Season - Ep 28, Carmen
Depois do enorme estrondo que tínhamos ouvido à entrada do hotel e todo aquele terror que existia à sua volta, a mente de Carmen apagou-se para a escuridão aparente. O que lhe tinha acontecido? Um vampiro simplesmente não morreria assim. Então, quais seriam os seus próximos passos?
“Oh Yeah, Sheftu!” by Carmen Montenegro
Acordei sobressaltada e aos berros. Não sabia onde estava,
nem reconhecia nenhuma forma. Sentia-me toda arrepiada, assustada e nervosa,
sem a ponta de orientação. Olhei em pânico para o que estava a minha volta.
Vi Samantha a sair da escuridão com o seu vestido. Ela
sorria-me.
- Então, miúda. Estás bem?
- Onde estou?
- Na morgue.
- Morri?
- Sim, porque os vampiros morrem, Carmen! – Ironizou ela.
Deu-me um leve empurrão. – É um breve esconderijo, até a confusão acalmar.
- Qual confusão?
Samantha suspirou. Saltou para cima do que parecia ser uma
cama de metal e cruzou a perna.
- Do hotel, a explosão... – Samantha ergueu a sobrancelha ao
ver que eu não estava a reagir. – Do que te lembras?
Olhei em volta, tentando recordar-me da última coisa que
tinha visto. Tinha uma dor de cabeça imensa mas, por fim lá veio alguns flashes
de imagem.
- Barulho. Vidros a cair. E...vi-te a gritar... – Olhei para
ela. – Espera... Explosão?!
- Explodiram com a penthouse. – Explicou Samantha. – O Eric
diz que foi uma fuga de gás...
- E tu não acreditas.
Samantha encolheu os ombros, largou um gigantesco suspiro.
- Tenho a minha teoria... – Voltou-se para trás, agarrou um
molho de roupas e atirou-mas. – Veste. Fui eu que escolhi o vestido.
Olhei para a roupa caída nos meus joelhos, ali estava um
belo vestido vermelho fluido de mangas largas.
- Porquê um vestido novo?
- Porque a tua roupa está... – Samantha analisou-me. –
Horrível! E segundo, porque vamos mudar de casa.
- Vamos? Para onde?!
- Não faço a mínima. O teu amigo Eric, é todo cheio de
segredos e mistérios. – Olhou para a porta e a seguir para o relogio. – Ele e a
Sheftu saíram.
- Há muito tempo?
- Coisa de meia hora. – Disse Samantha. – O Eric estava
mesmo preocupado contigo.
- Está sempre. Até em demasia... – Olhei à minha volta e vi
o local onde estávamos. Para além da minha mesa e a mesa onde Samantha estava
deitada, havia mais duas cobertas por um pano azul. Um lavatório, um frigorífico
velho, um espelho encardido e oito gavetas gigantes embutidas na parede. A
decoração era sombria, toda em ela num azul desmaiado a cair para o branco, e
para além de uns quantos diplomas na parede não havia mais nada. – Onde é que o
Eric foi?
- Não disse. Apenas pediu para manter-te debaixo de olho. –
Olhei para Sam com suspeita. – Acredita, ele praticamente fez-me ficar aqui
plantada. Se não estivesse sol lá fora, ter-te-ia abandonado... Mas, não. Pensa
nisto como um gesto egoísta da minha parte.
- Obrigada. – Disse eu. – Sabes se morreu alguém?
- Para alem de “nós”? Ninguém, apenas uns acidentados
que levaram com os destroços em cima...
- Subtil...
- Muito! – Ela saltou de cima da mesa. – Veste-te, eles não
tardam aí. Os sapatos estão aí debaixo.
Peguei pelas mangas e levantei-o, era um lindo vestido. De
facto, Samantha tinha um bom gosto. As mangas do vestido, eram largas,
prendia-se na cintura com uma faixa mais escura banhada com algumas pedras
brilhantes, para depois alargar e parar em cima dos joelhos. Os sapatos eram de
salto alto mas, em plataforma e abertos a frente. Vesti-o com gosto.
- Hum... – Samantha estava admirada. – Agora, diz-me porque
não te vestes assim no teu dia-a-dia?! Confesso, que ficas mais bonita.
- És a minha personal stylist, Sam.
Vi-a hesitar ainda, sob a alcunha mas, logo lhe passou.
- Pode até ser mas, cobro caro, minha querida. –- Olhou para
o meu reflexo no espelho. – Fazer as pessoas lindas tem o seu preço. Falta-te
algo...
Vi-a olhar para o meu pescoço nu e, automaticamente
lembrei-me da minha flor-de-lis, para a seguir lembrar-me de Dean e do seu
estado. Em como o tinha deixado. E, novamente fui assolada por um vazio.
- Dean...
- O quê?
- Hã?! Nada...Hum...a flor? Bem, deve estar na penthouse.
- Não, tu tinha-la quando saíste. De certeza que não a
perdeste por ai?
Eu suspirei.
- Deixa a flor, Sam.
Eu ri-me, e ela riu-se também. Não sabia o que era aquilo,
talvez o início de uma futura amizade mas, Samantha pareceu-me genuína naquele
momento e nada arrogante ou “nariz empinado” apenas uma vampira simpática.
Então, ouvimos o que parecia ser o som de um carro a
derrapar a alta velocidade, portas a bater e logo a seguir uma discussão entre
vozes. Foi fácil identificá-las, como era óbvio, era de duas pessoas apenas:
Sheftu e Eric. Seja qual fosse a discussão as vozes, vinham altas e os berros
eram tais que mal se conseguia identificar o tópico da conversa.
(…)
- Que eu saiba, eu é que devia de estar chateado com tudo
isto! Deixaste-me furioso, sabias?
- Tanto me faz.
- Fala de uma vez por todas comigo, Sheftu! Deixa-te de
criancices!
-Não tenho nada a te dizer.
- Mas porquê tudo isto?! Só por causa dos meus quadros?
- Os teus quadros?! Pois, aquilo me parecia mais os meus
quadros!
- Não, eram os meus quadros! Os quadros que tu destruíste
juntamente com toda a minha casa! Pensas que isto vai ficar assim é?
- Não vai não. Porque eu ainda agora comecei.
- Sabes muito bem onde tudo isto acaba, Sheftu! Nós os
dois sabemos como tudo isto acaba.
- NÃO!
- Agora já sabes, não há nada que possa fazer-te voltar
atrás Eu sei muito bem o que vejo!
O silêncio foi intenso entre os dois. E eu dei comigo e com
Samantha a olhar fixamente para a porta na expectiva de algo acontecer. A
seguir tão rapidamente, a porta da frente abriu-se mostrando a luz lá de fora e
a silhueta de Eric a formar-se à entrada. Mal, viu que nós escutavamos a
discussão ficou meio embaraçado. Sheftu veio logo a seguir.
- Ainda bem que estás de pé. – Disse Eric. – Belo
vestido...
- Graças á Samantha. –- Disse eu. Olhei para os dois
tentando perceber o que se passava. – Está tudo bem?
- Sim...
- Não! – Exclamou Sheftu.
- SIM! – A voz de Eric elevou-se, e por momentos vi-lhe um
laivo de irritação para com Sheftu. Depois voltou-se para mim com o seu melhor sorriso
novamente. – Estás linda!
- Oh chega! – Ordenou Sheftu. Avançou ficando entre mim e
Eric. – Dizes tu que eu sou criança, o que chamas a isto?! Vocês os dois,
cheios de mel e proximidade. Porquê?!
Não evitei em largar um sorriso gigante.
- Ciúmes, Sheftu?
Samantha riu-se com aquela boca Senti-a sentar-se na mesa
outra vez com as pernas cruzadas, fascinada por aquele cenário. Sheftu virou-se
para mim automaticamente com os olhos a faiscar.
- Eu dou-te os ciúmes...
- Okay! – A voz de Eric elevou-se novamente e a atenção foi
toda virada para ele. – Se queres saber, eu digo-te: A Carmen e eu temos uma
história. Uma longa história. Conhecemo-nos há algum tempo e tivemos uma
relação...
Subitamente Sheftu adquire um ar gélido, como uma múmia que
era. Voltou-se para mim lentamente com os olhos azuis a faiscar.
Naquele momento senti uma vontade enorme e aberta para fazer
Sheftu descer do seu pedestal. Portanto, encostei-me à mesa, mesmo perto de
Samantha, cruzei os braços ao peito e meti a minha mascara de má. Estava pronta
a dar um magnífico golpe no seu orgulho.
- Yep, eu e o Eric, namoramos...quer dizer...gosto mais de
dizer que fomos amantes durante muito tempo. Décadas! Claro que acabámos e
recomeçamos vezes e vezes... – Sorri ao lembrar-me de cada vez em que eu
expulsava-o ou que ele se ia embora depois de uma discussão acesa onde voavam
objectos. – Mas, foi bom enquanto durou...
- Oh meu Deus... – Disse Samantha sorridente. – Isto é
melhor que novela!
- Cala-te!! - Ordenou Sheftu raivosa.
- Hey, não me odeies só porque soubeste que não és a
primeira dele... – Ela atirou o cabelo para trás. – Tinhas bom gosto,
rapaz.
Eu toquei Samantha no braço pedindo-lhe que parasse, aquele
momento era meu.
- Foi há muito tempo mas, ainda me lembro... Estava eu num
bar algures em França, hum...foi em Paris...estava a procura de alguém para
beber. Estava aborrecida de morte, ninguém ali chamara a minha atenção, ninguém
era especial! Preparava-me para me ir embora, quando o vi entrar... Todo
vestido de negro, com um casaco comprido e o cabelo apanhado. Devo ter ficado
com um ar de idiota a olhar para ele mas, parece que resultou porque captei a
sua atenção. – Voltei-me para Sheftu, adorar a sua cara e a sentir-me puramente
má. – A partir daí fora o início de muitas noites de sexo...muitas mesmo! E
viajamos tanto! Inclusive, chegamos a viver juntos na Irlanda...
O silêncio foi instantâneo. Sheftu ficou parada no seu
lugar, com os punhos cerrados e a cara fechada num ar de pura irritação. Ela
abanou a cabeça, o seu olhar saltou de Samantha – em cima da mesa com um ar
divertido – para mim, que continuava com um ar superior e até Eric que estava à
distância dela. Voltou-se para a porta e quando saiu, fez questão de bater com
a porta de tal modo que a fez sair dos encaixes.
- Ena! – Samantha olhou para Eric e depois para mim. – Por
esta, admito, não esperava! Fizeram o meu dia, não há nada melhor do que ver a
Sheftu cair do seu pedestal...
Voltei-me para Eric, que estranhamente, sorria ou melhor,
ria-se. Ria-se sozinho de algo que lhe metia graça. Quando viu que eu o
observava, não conseguiu apagar o que sentia.
- Oh não te preocupes, que isso passa-lhe. Entretanto,
preparem-se, meninas... – Disse ele sorridente mexendo nos bolsos do casaco. –
Arranjei-nos uma casa. Uma mega casa.
Achei interessante o facto de Eric se incluir como novo
morado da casa.
Estendeu-nos o papel que mostrava uma enorme estrada que
dava a uma mansão de estilo Vitoriana rematada por uma floresta em volta. De
facto a casa era linda, grande e encaixava perfeitamente na paisagem. Tinha um
ar místico.
- Okay... – Disse Samantha. – E isto é aonde?
- Éscocia! – Exclamei eu ao ver a localização, nas legendas.
– Vamos para a Escócia?!
Quando levantei o olhar, Eric ia a caminho da porta com um
sorriso na cara. Piscou-nos o olho e saiu, sem dar mais explicação.
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