Moscow Season - Ep 4, Carmen

Mais uma vez Carmen sonhara com os fantasmas do seu passado e se torturava pelo que é. Porém, um novo mistério a assola. Quem será essa sombra que parece deambular tanto quanto os seus sonhos? Além do ódio que, mais parecia crescer a casa segundo, provocava imensas confusões naquela penthouse...

"I Feel You" by Carmen Montenegro


Passado o choque inicial de o ver a minha frente, tentei atacá-lo com a minha estaca de madeira mas, ele fora mais rápido e atirou-a para longe. A seguir, segurou-me pelo pescoço e elevou-me a uns vinte centímetros do chão, para que ficasse da mesma altura que ele.
― Isso não foi bonito, Carmenzita! – Disse o meu Criador, com aquela voz suave e sensual com o seu sotaque francês escondido debaixo do seu espanhol. ― Aiii esse olhar…que ódio me tens. Os teus olhos deitam faíscas. Fascinante!
De facto devia estar mesmo com um ar de ódio na cara, só me apetecia espetar uma estaca no local onde este idiota tivera um coração.
― Eu odeio vampiros!
― Oh eu sei… – Deixou-me cair ao chão com força, para depois voltar a levantar-me e agarrar-me pelo pescoço. ― Eu noto pelo teu fio…
Ao pescoço eu tinha um fio que ele tocou. Tinha pequenas bolas com um símbolo diferente gravado, contava para cada vampiro que já tinha morto. Ao todo eram 24 bolas de prata.
― Vais ser o próximo! – Ameacei. ― A minha jóia da coroa. Uma bela bola vermelha mesmo no meio, símbolo do teu sangue…
Ele aproximou a sua cara da minha, conseguia sentir o seu nariz frio contra a minha pele e a sua boca próxima da minha. Com força arrancou o fio do meu pescoço e segurou-o com a mão direita, observou as bolinhas de prata e suspirou.
― Meus irmãos… – Lamentou. Atirou o fio para longe e olhou para mim. Agora eu tinha medo. Sem o meu fio, o meu pescoço estava a descoberto e ele podia aproveitar-se. Comecei a sentir o pânico a crescer-me no peito e ele também sentiu. Abriu os seus olhos de um azul estupidamente cativante.
― Fascinante, como passou de uma fúria mortal para…medo. Medo? Não, um terror absurdo!
― Não tenho medo de ti, presas!
Ainda cuspi para a sua cara mostrando não ter medo, mesmo que o batimento do meu coração me denunciasse por completo. Estava aterrorizada mas, não disposta a morrer sem dar luta.
Ele limpou o cuspo da cara, e empurrou-me contra a parede com toda a força, depois fui levantada no ar e atirada através da sala. Embati na outra parede, para depois cair no chão com força. Senti a dor a alastrar-se pelas costas, pela barriga e pela cabeça.
Ele virou-se para mim com aquele porte elegante e sorriu mostrando uma dentadura branquíssima com as presas de fora.
― Vais sentir medo, Carmenzita. Muito medo!

Mas que raio! Porquê que eu teimava em viajar para o passado, quando o passado nada ajudava?
Dei comigo em frente a porta do hotel, sem me lembrar de como cheguei até ali. Sei, que viera a conduzir isso, é certo mas, parece que todo o caminho fora feito num estado de inconsciência enquanto eu recordava o passado. Deixei cair a cabeça no volante, estava cansada daquilo, daqueles flashbacks dolorosos que só me faziam sentir vergonha por não ter lutado mais…
Passei os dedos pela minha flor-de-lis. Havia derretido as minhas 24 bolas de prata, sinais da minha conquista, e tinha-lhes dado uma nova forma. Uma flor-de-lis que levava sempre ao pescoço, era uma maneira de manter quem eu era.
Bateram no vidro e eu assustei-me, um jovem apareceu do lado de fora do carro, com um sorriso. Abriu-me a porta e eu saí, entregando-lhe a chave, sem grandes conversas. Parei á porta do hotel apreciando a neve que caía como uma chuva de esferovite. Estendi a mão e deixei uns flocos caírem-me na palma.
Atravessei a porta giratória, cumprimentando o porteiro e as meninas ao balcão, sempre muito simpáticas e bonitas. Passei por alguns socialites que partilharam o seu olhar de desprezo pela minha pessoa, olharam-me de soslaio. Ser mais jovem e mais rica do que eles era uma ofensa. Principalmente, para as mulheres, que viam os olhares dos maridos sempre que uma de nós passava.
Inveja, um sentimento mesmo muito feio.
Carreguei no botão para chamar o elevador e lá, esperei.
― Menina Montenegro! – Reconheci logo a voz sem ter de virar-me. Quem mais senão o Concierge do hotel. ― Menina Montenegro!
O homem era chato, irritante e sempre a tentar agradar. Já tinha passado pela cabeça de todas arrancar-lhe o coração mas, daria muito trabalho.
Não me virei sequer, continuei a observar a porta de elevador, que parecia ser mais interessante…
Faltavam três andares para o elevador chegar.
― Menina Montenegro! – Ouvi os seus passos aproximarem-se e ficou ao meu lado, com o seu perfume enjoativo. ― Boa noite, como está?
― Bem…
― E as suas irmãs?
Faltavam dois andares.
Sim, ao olho humano nós éramos irmãs. Irmãs! Três eram estupidamente pálidas e frias, enquanto as outras duas pareciam ser de outro mundo. Sim, irmãs! Sem contar com a diferença física; uma loira, outra morena, uma ruiva, uma de olhos azuis, outra de olhos pretos. Sim, Irmãs!
― Estão todas óptimas.
Faltava apenas um andar.
― Menina Montenegro… – Estava a farta-me daquela voz. ― Posso perguntar-lhe uma coisa?
Raios, o elevador parara mesmo no último andar!
― Sim, Sr. Dubois?
― Porque não deixa a nossa equipa de limpeza entrar na penthouse? Temos a melhor equipa de limpeza, todas as nossas empregadas são óptimas funcionárias! E a equipa e manutenção do hotel é cinco estrelas! Se tem medo que alguma coisa seja roubada, pode deixa-las no cofre enquanto é efectuada a limpeza…
O som mais maravilhoso invadiu os meus ouvidos. O elevador tinha chegado e as portas estavam abertas a espera para me levarem daquela conversa idiota.
― Não, Sr. Dubois. – Disse interrompendo-o. Entrei no compartimento. ― Acredite, não precisamos de funcionários de limpeza lá em cima…
― Porquê?
Porque da última vez, a Samantha quase que mata um belo rapaz que limpava as janelas e a Sheftu queria brincar aos aperitivos com o homem que vinha arranjar o ar condicionado.
― Acredite, Sr. Dubois…não queira saber…
A porta fechou-se e eu subi.

Assim que o elevador parou na penthouse, entrei em pleno ambiente tenso, conseguia distinguir as vozes de Verónica e de Claire em conversa sussurrada. O assunto parecia mortalmente sério.
Fiquei parada junto a porta a ver se conseguia ver alguma coisa mas, elas não bruxas a toa!
― Não sabias, que é feio ouvir atrás das portas, Carmen? – Perguntou Verónica com toda a sua pose e circunstância. Empurrei a porta e entrei.
― Já passei o tempo para ser politicamente correcta, Verónica.
Verónica ergueu a sobrancelha e virou-me a cara, trocou olhares com Claire. Às vezes parecia-me que as duas tinham uma espécie de poder, podiam falar por pensamento…era estranho!
― Como é que chegaste a casa tão depressa? – Perguntei olhando para Claire, enquanto tirava o casaco e metia as chaves em cima da mesa.
― Vim a pé…
― Hum… – Respondi eu. Porquê que tinha a impressão que se tinha passado mais do que uma simples noite? ― Passou-se alguma coisa enquanto estive a caçar?
As duas trocaram olhares e aí eu vi; Verónica mexeu-se demais, parecia nervosa com alguma coisa e Claire, fez o que pôde para parecer normal, mostrando-me um sorriso.
― Não, tudo bem. Tirando a Sheftu que está de mau humor e a Samantha que está sempre a chatear…
O meu sentido de caçadora, dizia que havia ali qualquer coisa mas, não forcei. Olhei para a minha camisa branca suja de sangue.
― Bem, vou trocar de roupa…
Elas não pareceram minimamente preocupadas com o facto de me ausentar, pelo contrário, ainda nem tinha chegado a meio do corredor quando ouvi Verónica e Claire a sussurrar.
― Verónica, ela pode ajudar-te…
― Não!
― Ela pode descobrir quem anda a telefonar-te e o que te aconteceu! Já que ninguém viu…
― Nem pensar, que vou pedir ajuda aquela miserável! – Pela sombra vi que estava de pé. ― Este assunto é meu, e eu vou saber quem é. Ninguém se mete comigo e fica assim…
Sorri para mim mesma, tinha de admitir: Verónica era impossível às vezes mas, tinha espírito guerreiro e era lutadora, talvez seja por causa do seu passado.

Subi as escadas que davam para o meu quarto; Tinha custado os olhos da cara encontrar uma penthouse grande o suficiente para todas nós, mas, assim que vimos esta todas concordamos. O meu quarto ficava algures lá em cima, mesmo ao fim do corredor. Tinha sido ainda mais caro, decorar o quarto de acordo com o gosto de cada uma, queríamos que fosse o mais parecido com um lar possível.
Entrei no meu quarto às escuras e acendi a luz. O meu quarto estava todo decorado em tom vermelho, com uma grande cama de casal, uma secretária com um computador, um enorme guarda-fato – sim, todas tínhamos uma extensão enorme de roupas e sapatos. Não é por sermos vampiras que deixamos de ser mulheres! – E casa de banho. Podia dizer-se que era o mais pequeno de todos.
O maior quarto e o mais afastado ficara para Samantha, ninguém queria ouvir o que ela fazia com as suas “visitas”.
Sentei-me na minha cama pesadamente, peguei no cabelo e enrolei-o numa cebola, subitamente, lembrei-me daquele vulto enquanto caçava. Precisava de me concentrar se queria saber quem me seguia. Ainda me lembrava da silhueta daquela sombra atrás da árvore; Era um homem, isso era certo, e parecia ser forte e musculado. Como tinha o raio de um capuz na cabeça, não pude ver a cara. Parecia ser forte e tinha as pernas um bocado arqueadas. As suas mãos estavam dentro dos bolsos, enquanto olhava para mim, como se tentasse esconder-se o máximo possível. Então ele sabia que eu o conhecia…
Mas, o que mais picava debaixo da minha pele era aquele cheiro. Com tantos anos de experiência, o meu olfacto tinha-se tornado muito apurado, assim como a minha memória olfactiva. Eu conhecia aquele cheiro mas, de onde?!
Fechei os olhos e recordei a mistura de aromas que senti, ao ver aquela sombra: Carvalho, terra molhada, madeira, cabedal…
Meti as mãos em volta do nariz, como se tentasse conservar o aroma e novamente, aquela sensação de que conhecia aquilo e que o nome estava mesmo debaixo da minha língua.
― Quem és?
Num momento, breve mas de grande impacto, viajei para uma floresta. Reconheci o sol quente que sobressaía a da copa das árvores e o olhar baixou para uma pequena casa de madeira. Eu olhava fixamente para aquela casa e sentia um turbilhão de emoções. Queria algo daquela casa…algo chamava-me loucamente…
A memória desvaneceu-se rapidamente, e abri os olhos. Estava de novo no meu quarto.
― Raios!
Num momento de irritação, levantei-me e derrubei a cadeira. Detestava aquela sensação.
Saí do quarto praticamente a voar, irritada comigo mesma, por não me lembrar. Desci as escadas e ao virar, para a sala tropecei nuns sacos de comida. Fiquei com as calças sujas de um molho cor de laranja.
― Mas que…Que porcaria é esta!?
O molho tinha um cheiro horrível, ou era simplesmente a minha adversão a comida que falava.
― É comida chinesa! – Exclamou Samantha ao fundo corredor com um ar super natural. ― Quis comprar.
― Para quem? Nós não comemos!
― A Claire e a Verónica comem!
― Mas não comem comida chinesa, Samantha! – Abri o saco e o cheiro enjoou-me. Aquilo era horrível! Mas, reconheci algumas iguarias caras, muito caras! Larguei o saco e observei o pescoço de Samantha onde brilhava um colar muito caro ― Onde arranjaste isso?
Ela afagou as pedras ao pescoço.
― Numa joalharia aqui perto. É lindo, não é?
― E caro! – Passei por cima do saco de papel. – Não podemos fazer gastos desnecessários! Temos que manter-nos o mais discretas possível…
― Discretas?! Não sei se reparas mas, estamos numa penthouse num dos melhores hotéis do mundo e tu conduzes um Mustang feito por encomenda! Como queres ser discreta?!
Ouvi passos atrás de mim e reconheci o cheiro de Verónica e Claire, sempre juntas. No cimo das escadas, entre nós as duas, apareceu Sheftu com um brilho nos olhos.
― Não quero saber! Vais devolver essa jóia e esta comida horrível.
― Não! – O olhar de Samantha era de desafio. ― Lá porque tu não aceitas quem tu és, não significa que tenha de fazer o mesmo!
Quase voei na sua direcção de Samantha. Estava mesmo perto, só algo preenchia o espaço e era Claire que me agarrava os ombros. Vi Sheftu a descer uns degraus também e senti Verónica mais perto, as duas prontas a intervir caso acontecesse o pior.
Samantha não tinha arredado o pé quando me viu a avançar mas vi, um laivo de susto quando me viu tão perto, tão rápido. Se eu a atacasse, por ser mais velha e mais forte, tê-la-ia magoado muito seriamente, senão morto.
Sentia as mãos de Claire a empurrarem-me para trás
― Carmen, por favor…
Não sei porquê, talvez fosse aquela coisa…aquela sensação esquisita de ser Claire a pedir que me afastasse, que acabei por fazê-lo. Recuei alguns passos mas, Verónica e Sheftu mantinham-se por perto.
Ia voltar para o quarto, quando voltei-me de repente e chutei o saco de comida chinesa na direcção de Samantha. O saco levantou voo e caiu mesmo no vestido roxo que a vampira trazia vestida.
Sheftu sorriu muito levemente, senti Verónica a conter uma gargalhada e, também me pareceu ver um laivo de divertimento nos olhos de Claire.
― Sua cabra! – Gritou Samantha avançando para mim, quase atropelando Claire que estava no seu caminho.
― Samantha! – A voz de Sheftu fez-se ouvir forte e Samantha parou a poucos metros de mim. ― Já chega! Vai trocar de roupa, e limpa esta porcaria.
Samantha virou-se para com um ar de ofensa mas, Sheftu era a mais velha, logo uma ordem dela tinha que ser respeitada.
― Mas…
As duas trocaram olhares, até que Samantha desapareceu rogando pragas a toda a gente.
― O mesmo vale para ti Carmen, vai mudar de roupa.
Para depois voltar a subir as escadas, pouco tempo depois a sua porta bateu. Verónica e Claire, ambas olharam para mim surpresas, mas logo retiraram-se para o seu mundinho em silêncio e fiquei no corredor, até subir outra vez.

Dirigi-me para a minha janela, abri os vidros e meti a cabeça de fora. Passei os olhos pela cidade coberta pela neve e agora, quase deserta a medida que a noite se arrastava. De vez em quando passava um ou outro carro, ou uma pessoa. A escolha dos nossos itinerários, estava ao cabo de Verónica e Claire, elas com os seus poderes, levavam-nos por ai. O que era bom! Admito, elas têm bom gosto para escolher locais perfeitos mas, Moscovo…não sei…era algo que simplesmente fascinante. Uma cidade na qual nunca tinha posto os pés até ter sido vampira, no entanto, a adoração era tanta que levava a crer que numa outra vida, tinha andado por aqui.
Passeei olhar pelas ruas, vi um casal apaixonado a andar de mãos dadas. Um grupo de jovens a sair para a noite. Passou um carro com música aos altos berros. Guardas policiais a fazer as suas rondas com passo lento e olhar atento. Fechei os olhos devorando o frio, que não me atingia, e apreciando a noite minha amiga, aquilo era tudo! Puro silencio e beleza.
Até que reparei num homem. Devia estar na casa dos 30 anos, de cabelo castanho claro e um porte magnífico. Estava encostado ao poste, com as mãos nos bolsos e a perna cruzada, numa pose casual. Trazia um casaco de cabedal castanho e umas calças de ganga já gastas e…olhava directamente para mim.
A brisa gelada, trouxe-me o cheiro que logo reconheci. Era ele quem me observara a momentos. Era sim! Quando reparou que eu o reconhecera, ele endireitou-se e pareceu olhar-me com mais frieza.
Num impulso saí do quarto a correr. Estava disposta a saber quem era este homem que me perseguia! Saltei o lance de escadas que me levava ao corredor, caindo mesmo à frente de Claire, com facilidade.
Seja o que for que ela iria dizer eu não ouvi, limitei-me a correr corredor fora. Abri a porta e, ao invés de chamar o elevador abri a porta das escadas de emergência e saltei lá para baixo. No total deviam ser uns 15 andares, mas caí com agilidade.
Abri a porta de emergência e corri até a entrada, passando pelo porteiro que ficou a olhar para mim espantando com a velocidade...ou será da minha camisa manchada de sangue?
Virei a esquerda, e segui para a rua de onde tinha vista mas, não vi ninguém. Estava deserta. Apenas a neve, e o candeeiro solitário ocupavam aquela zona. Não se via polícias, nem casais apaixonados ou jovens embriagados. Nada.
Ele tinha desaparecido outra vez.
Aproximei-me do candeeiro onde ele esteve e cheirei profundamente. Estava impregnado com o seu aroma mas, parecia acabar ali. Seja o que for que usava, tapou-lhe o cheiro e não podia segui-lo.
Reparei que no candeeiro estava um papel ali pendurado. Com o máximo cuidado e jeito tirei o papel do poste e levei-o aos olhos. Assim que li o que ali estava fiquei ainda mais tensa e preocupada.
No papel lia-se: “Eu disse que te encontrava…”

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