Immolation Season - Ep 17, Sheftu
Sheftu se juntara a Beth para tentar descobrir por onde tinham sido apagadas as suas últimas memórias. Mas nada, tudo se fazia vibrar sobre as paredes menos as respostas que ambas procuravam. O seu instinto dizia que não seria nada mais do que aquele loiro idiota. Talvez tivesse certa, porém agora não era o tempo de continuar a investigar: chegara a hora de aceitar Dean como um novo membro eterno do grupo.
"Your Leaps Are Like Peace To Me" by Sheftu Nubia
Tentei ter uma desculpa para não poder sair
deste quarto, mas eu sabia que brevemente Eric estaria bem ou, pelo menos, o
que se podia entender por estar vivo e consciente. Por mais que tentasse tirar
isso da minha cabeça, mal conseguia aguentar a minha culpa. Eu era a causa de
todos os seus problemas, ao ponto de por a vida dele em risco. Irónico, não é?
Levantei-me rapidamente para tentar fazer algo
que me impedisse de pensar. Vesti-me, saí do quarto sem olhar para trás, estava
cada vez mais difícil deixá-lo ali, principalmente com a crescente sensação de
estarem constantemente a observar-nos.
- Beth… - Eu disse, entrando no seu quarto, ou
melhor, o antigo quarto de Trish. Estava condenado a ser ocupado por bruxas que
tinham uma ligação especial por mim: umas para me matarem, outras por se
tornarem minhas confrades. Sua expressão estava apagada, longe de tudo,
enquanto da sua mão saía uma pequena bola de fogo, que ia ardendo e ardendo
como se nunca mais acabasse.
Não pareceu ouvir-me, por isso me aproximei
mais, colocando a minha mão sobre a sua, queimando-se levemente ao passar sobre
as labaredas que ela gerava. O meu toque a despertou dos pensamentos, o seu
olhar encontrou o meu e seu semblante rapidamente adquiriu uma expressão
preocupada, voltando-se depois para raiva e afastou-se de mim. Era normal que reagisse
daquela forma depois de como ela tinha saído do meu quarto.
- O que aconteceu? – Perguntei-lhe, apesar de
novamente não obter qualquer resposta. – Se precisas da minha ajuda, sabes que
podes contar comigo.
- Isso viu-se! – Declarou ela, virando-se para
mim com a raiva a fluir-lhe livremente no olhar, voltando-se novamente para o
espelho. Como se algo nele a fizesse observar algo mais, porque não estava a
ver o reflexo, mas algo mais profundo… Como se existisse algum feitiço sobre
aquele espelho. – Tu simplesmente me trataste como tua serviçal e me
dispensaste quando não precisavas de mim. Isso não parece nada diferente de
Gustav. Só porque não sofres com os meus poderes, não quer dizer que eu seja
inferior a ti.
- Beth… - Suspirei profundamente, sentindo-me
cansada de tantas lutas e tantos mal entendidos… - Não tem nada haver contigo…
Nada disto tem haver contigo.
- Como não?
- Esquece. – Não havia razão para estar a
continuar com tudo isto, estava cansada de tudo. Suspirei e voltei para o meu
quarto.
A sua pele estava vertiginosamente suave, já
conseguia ver a cor a voltar completamente ao seu rosto. Era só fechar os
olhos, que tudo rapidamente parecia voltar ao normal. O seu calor cativava-me,
aquele aroma que se impregnava sobre o meu olfacto acalmava-me. Algo simples,
único e demasiado revelador para mim.
- O que foi desta vez? – Perguntei eu,
retirando a minha mão da sua pele e voltando-me para a porta, onde Beth
permanecia imóvel como se estivesse a pensar na forma como me iria dizer o que
tanto a perturbava.
Ela avançou a porta, pegando nela depois de
seguida e colocando-a no seu devido lugar. Não que valesse de muito porque
haviam muitas remodelações a fazer nesta casa, talvez fosse pela leve sensação
de que ninguém estaria a ouvir-nos. O que era ridículo, porque eu bem sabia que
o que não faltavam por aí eram ouvidos. Ainda por cima agora, que tinha a leve
sensação de que éramos constantemente observados, não sei porquê, mas a cada
momento sentia isso ainda mais, como uma confirmação do que estava a acontecer.
- Precisamos de falar sobre algo… - Fez uma
breve pausa, concentrando-se, enquanto tirava a pulseira que sempre usava no
seu pulso. Fechou o seu olhar e elevou ligeiramente as suas mãos, por momentos
consegui ver parte da sua energia a esvoaçar pelo quarto, deixando que todas as
paredes conseguissem sentir parte do seu puder. – Já há algum tempo que não
faço isto… - Disse, sorrindo. Aí compreendi que tinha criado um campo de som
dentro do meu quarto, respondi-lhe com outro sorriso, não deixando de
levantar-me e colocar as minhas mãos sobre os seus ombros.
- Diz-me o que se passa…
- Ultimamente tenho a leve sensação de que
estamos constantemente a ser observados.
- Sinto exactamente a mesma coisa. Como se
alguém estivesse constantemente a rondar a casa, chegando até a aproximar-se o
suficiente.
- E o pior é que acho que alguém conseguiu de
alguma forma eliminar parte da minha memória. – Fez uma pausa, afastando-se um
pouco para a janela, observando o exterior. – E quem o fez é muito bom nisso.
Eu tenho tentado reatar essa parte da minha memória e até agora não tenho tido
sucesso.
- Quando isso aconteceu? – Perguntei curiosa.
- Lembras-te quando me disseste onde era o
quarto? – Eu acenei levemente a cabeça, sentando-me novamente na beira da cama,
mas agora do outro lado, perto dela. – Eu me recordo bem que ia até lá e depois
abri a porta, essa foi a última parte desse dia que me lembro. Depois, já é
dia, e estou eu deitada sobre a cama, confusa, sem saber ao certo como tinha
ido lá parar. Ainda estava vestida com a mesma roupa, nada se tinha alterado a
não ser um ligeiro vazio, que quanto mais eu tentava reaver, mais profundo
ficava. E acredito que tenha acontecido algo quando abri a porta daquele
quarto. Apenas não me lembro o quê.
- Temos de tentar descobrir o que está a
acontecer… - Disse, levantando-me e observando a janela, algo passou
rapidamente pelo arbusto morto que permanecia em frente a mim, e não gostava
mesmo nada desta sensação de todos os meus passos estarem a ser observados.
Ela observou-me, enquanto eu abria a porta e
seguia em frente, descendo as escadas, de volta ao local que estava
completamente destruído.
- O que estás a fazer? – Perguntou-me
sossegadamente, de uma forma quase inaudível.
- Porque estás a sussurrar?
- Tu respondes perguntas com outras perguntas?
- Estou a tentar encontrar rastos que me
possam indicar o que se está a passar nesta casa. – Respondi.
- E o que esperas tu encontrar? – A sua ironia
atingiu-me como uma flecha, por isso nada disse, continuando na minha procura
por pequenas dicas nas paredes… Minhas mãos se colocaram sobre o que restava da
biblioteca, fechei o olhar e tentei sentir. As vibrações continuavam a gritar,
mesmo depois de ter passado tanto tempo, continuavam as sensações a florescer
em mim. Era como se conseguisse realmente encontrar aquele nojo habitual, mas
não tinha sequer entrado por aqui. Quase que conseguia pressentir o nojo forte
sobre os meus sentidos, por isso procurava e procurava o caminho que pudesse
ter aquele loiro maldito tomado.
Calculei que nada lhe interessasse, a não ser
a parte superior da casa. Era estranho como podiam estar a espionar-nos sem que
sequer déssemos conta. Mas e se fossem invisíveis sobre os nossos olhos? Isso
ou eu estaria completamente louca, com a mania da perseguição mais forte do que
pensava.
Continuamos à procura, com movimentos lentos,
quase inaudíveis. Apesar de tudo, nada consegui encontrar. As protecções de
Eric estavam completamente destruídas, era simples localizar-nos, até mesmo em
quilómetros. Desde que a morte chegou murcha dentre toda a fauna, parte de mim
nunca conseguia realmente sentir-se livre. Havia algo, e eu não iria certamente
gostar nada. Mais problemas, certamente.
- Uma manhã inteira que demoraste, aqui às
voltas para me dizeres que não sabes o que se passou? – Perguntou-me Beth,
ligeiramente irritada.
- Não compreendo... Simplesmente se foram,
deixando tudo para trás, sem qualquer rasto. Vladimor… Samantha… Simplesmente
desapareceram, sem qualquer aviso. Talvez isso esteja relacionado, será que os
mataram enquanto esperavam pela Carmen? – Perguntei-lhe, apertando o punho com
raiva...
- Isto tem sido tudo muito cansativo para ti…
Devias descansar. – Tentou acalmar-me, tocando no meu ombro. Rapidamente me
afastei.
- Acalmar-me?! – Ripostei. – Como tu queres
que eu me acalme com tudo isto a acontecer mesmo aqui à minha frente e eu sem
saber o que se passa?
A minha pergunta esvoaçou, ao mesmo tempo que
Dean se aproximava. Seu sorriso dizia tudo para mim, tinha conseguido alcançar
o seu objectivo. E, por mais radiante que ele pudesse estar, na realidade iria
estar morto quando tudo isto acabasse.
- Conseguiste? – Perguntei-lhe retoricamente.
Seu sorriso ainda se abriu mais como resposta, modificando-se então para uma
expressão séria.
- Ela nunca o fez… Parece insegura… - Fez uma
breve pausa, que não consegui decifrar ao certo. – Podias ajudá-la? Só para que
eu tivesse a certeza que tudo corresse o melhor possível.
- Ela não irá aceitar…
- Já aceitou o que eu queria, agora apenas tem
de acatar com a responsabilidade. – Seu sorriso voltou, tentando de um certo
modo arrancar o que queria também de mim. – Então, vens?
Olhei para Beth, que silenciosamente me dizia
que tínhamos outros assuntos a
tratar, mas o que eram segundos numa eternidade como a minha?
- Tudo bem… Nós estaremos lá.
- Nós?! – Perguntou a Beth, surpreendida.
- Vá, aposto que nunca viste realmente como o
fazer logo de início… Até pode ser divertido.
- Duvido… - Bufou ela. – Vamos lá acabar logo
com isso.
Seguimos para o quarto da Carmen, ele
simplesmente olhou para o seu primo, que saía logo de seguida, deixando-nos só
nós os três.
- Estás preparado? – Perguntei-lhe, que já
começava a sentar-se na cama. No seu olhar vi um ligeiro temor, que rapidamente
foi mistificado com uma coragem imensa: esse era o Dean que conhecia, arrojado,
corajoso e orgulhoso.
- Claro!
O silêncio ficou abismal, enquanto esperávamos
que a princesa viesse finalmente fazer o seu trabalho… Não demorou muito até
que ela aparecesse, mais hora menos hora, Dean tinha conseguido abafar o não dela e transformá-lo num sim decidido.
- Vamos ter público? – Reclamou ela ao entrar,
observava-me como se fosse um inimigo a abater, talvez até pensasse isso mesmo.
- Eu quero que fiquem. – Disse Dean, enquanto
o seu primo entrava também no quarto.
- Pois, eu não. – Carmen estava decidida a
levar a sua avante, mas o seu olhar logo morreu, mal começou a pensar… Sim, as
expectativas que ela ganhasse esta batalha eram mínimas, já para não dizer
nulas.
- Por favor? – Pediu ele, levantando-se e
dando a ela um ponto de vista nada bom, eu estava mesmo ao lado dele, caso ele
pedisse, eu o tinha prometido. Logo, ele estava encostando-a entre a espada e a
parede. Ela tinha consciência disso.
- Tudo bem. Se é o teu último desejo. – Contrariada, acabou por ceder novamente. Afinal eu
era um peão e tanto neste jogo de xadrez!
- Sim. – Afirmou ele, sentando-se na cama,
observando-nos como se fosse a sua última vez. Eu sorri-lhe, realmente seria a
última vez que me olharia como humano, brevemente morreria, se tornaria algo
semelhante a mim. Um vampiro.
Carmen avançou para ele, sentou-se no colo
dele e encarou-o por uns momentos, talvez recordando-se de cada traço deste
momento que agora vivia. Era curioso como tínhamos algo em comum, esta loucura
a que chamam amor nos faziam seguir em frente, mesmo quando tudo o que
queríamos era fugir de tudo isto. Eu bem sentia essa emoção com Eric.
Dean estava eufórico, não sabia o que esperar,
sua pulsação gritava por socorro, mesmo que ele o quisesse, seu corpo bem sabia
o que as próximas horas lhe trariam. Não, não era nada bonito de sentir. Eu bem
o sabia. Pelo menos a rapidez do seu sangue traria melhor fluidez para o que ia
acontecer, a morte se tornaria mais rápida.
A parte seguinte tornou-se demais para mim.
Lembrava-me da dança que tinha feito com Eric há umas horas antes, eram dois
seres que se amavam, apesar de tudo, eles conseguiam completar-se. E a calma
era algo que conseguiam ter, apesar de tudo, as emoções daquele amor conseguiam
ser um pequeno bálsamo para o que ia acontecer. Não que durasse por muito
tempo, mas pelo menos a fase inicial seria mais simples.
Vi que ela se preparava, todo o seu corpo
ficou rígido quando o seu pensamento voltou-se para o passo seguinte,
mordendo-o com uma força que seria necessária para que tudo acontecesse
correctamente. Seria muito pior se Dean não estivesse o próximo suficiente da
morte, antes de receber o néctar ingrato. A dor arrancava de Dean as agonias,
deixando-o berrar com todos os seus pulmões ainda vivos, mas não por muito
tempo. Seu corpo lentamente cedia e eu só esperava que Carmen conseguisse
fazê-lo. Eu me recordava bem da primeira vez que o tentei fazer, sem grande
sucesso, pois não consegui acabar com o humano, deixando-o mesmo a morrer de
agoniante dor, deixando-o algures pelas ruas uns dias seguintes. Tinha-me
precipitado e custava a vida daquele a quem eu tinha escolhido para me
acompanhar, mas hoje até agradecia esse meu erro. Conheci Henry, porém, tive de
matá-lo também…
Finalmente seus pulmões cederam, seu corpo
cedeu, até as suas batidas do coração quase cediam. O instinto de Carmen estava
correcto, quando o seu sangue finalmente atingiu a boca dele, o único problema
era saber o quanto seria necessário para que tudo acontecesse, sem deixar
sequelas que pudessem fazer a vida do recém-nascido curta. Caso o corpo dele se
infestasse de sangue do vampiro que o transformava, poderia trazer sérias
consequências. A sede descontrolar-se-ia por séculos, até que conseguisse
recuperar totalmente. Havia uma medida certa para tudo, e com os meus erros
tinha-o aprendido.
- Carmen, já chega. – Disse-lhe, tentando
travar a sua atenção. Ainda demorou um pouco para que o corpo dele se desse ao
sangue que tinha ingerido, até que finalmente começou a sua última batalha
contra a morte, aquela que ele iria perder. Ainda me recordava da dor que me
tinha trazido a transformação, principalmente para o que tivesse restado da
alma que já perdera há alguns milénios… Carmen observava, não sabia ao certo o
que se passava pela cabeça daquela vampira, estava completamente inexpressiva.
Ao contrário do Frankie que, além de humano, nunca na vida tinha visto uma
transformação a dar-se. E era muito pior, principalmente sendo do seu primo o
corpo que se transformava, morrendo, enlouquecendo de dor.
O silêncio apoderou-se novamente do quarto,
tudo tinha terminado, fiquei um pouco mais, tentando ver se algo corria mal.
Mas logo conclui que a transformação estava certa, só faltava o tempo fazer o
resto…
Mal entrei no quarto, ou pelo menos o que
ainda restava dele, dei logo conta que havia algo diferente, mais leve e sublime.
A água ouvia-se suave, o que me trouxe uma sensação de paz. Quando ele tinha
acordado, eu não o sabia. Mas era bom saber que tudo poderia voltar ao que era,
apesar de tudo.
Segui para perto da porta, observando o seu
corpo nu, onde a água ia caindo, deixando que tudo o que tivesse acontecido na
minha mente, todos esses problemas, simplesmente se esfumassem cobre um imenso
sorriso. Era bom senti-lo de volta, parecia surreal, porém a realidade se fazia
sobre aquele sorriso. Meus lábios se abriram para dizer algo, rapidamente se
fechando e observando-o melhor. A distância no momento era a única coisa que
conseguia manter-me distante dele. Era bom voltar-me a sentir em casa.
- Está tudo bem? – Perguntou-me, com os seus
lábios brilhando ainda mais quando me aproximava, encurralando-me
completamente, que a tentação viesse!
- Sim, está tudo perfeito.
Não era um simples roçar de lábios ou uma
sensação em que dois corpos se demonstravam um no outro. Seus lábios
tornavam-se paz em mim. E eu me entrego a ti, demónio louco que me torturas! As
tuas asas me cercam, num momento de paz, de vida!
A noite simplesmente tinha paralisado, já
sentia a saudade da sua voz, do seu olhar e de tudo o que simplesmente ele era
para mim. A minha pele permanecia quente sobre a sua, sua respiração leve
ecoava sobre os meus ouvidos enquanto os seus dedos traçavam movimentos
circulares sobre as minhas costas. Um suspiro profundo saiu sobre a sua boca
quando aninhava a minha cabeça para mais perto da dele, aproximando os meus
lábios daquele seu sorriso maravilhoso.
- Apetece-te dar uma volta por aí? –
Perguntei-lhe num impulso. Seu corpo se estreitou mais sobre o meu e pousou
suavemente os seus lábios sobre a minha testa, descendo um caminho ao qual eu
já sabia o destino. A sua calma perdeu-se quando nossas bocas se entreabriram
sem que realmente palavras fossem necessárias, uma paixão que se mantinha bem
viva.
- Talvez seja o melhor… - Disse-me entre
beijos, levantando-se num salto, fazendo a dança em sentido contrário,
procurando algo que pudesse vestir e eu fiz o mesmo.
Pouco tempo depois, enquanto Eric fazia
algumas chamadas, estávamos de saída.
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