Immolation Season - Ep 15, Julian
Julian continuava pela sua descoberta sobre a Sheftu. Não fazia ele a mínima ideia do que iria obter. Se pensava que aquela loira era intrigante, então cada parte do passado que parecia mais real para ele - depois que encontrasse Ian - iria trazer bem mais questões do que respostas. O que ele faria com todas essas perguntas?
"Blondie" by Julian Carriere
Uma viagem rápida, graças aos meus poderes. Se bem que eu
tinha que ter cuidado, e não abusar em usá-los. Era poderoso para aguentar uns
quantos teletransportes, mas a verdade é que não era tão poderoso como no
passado. E talvez estivesse a levar a minha investigação intensamente, talvez
até em demasia.
Estávamos junto à muralha, com a entrada mesmo à nossa frente.
O lugar onde Sheftu estivera prisioneira, há algum tempo atrás. Dei um pequeno
empurrão ao homem, para que ele avançasse, e seguimos os dois para dentro
daquela cidade parada no tempo.
Chegados ao castelo, deparamos com dois vampiros na entrada.
Fui cordial, não queria confusões. Estava numa terra que merecia ter a sua
legião de vampiros. Já bastava a quantidade de caçadores que vinham a acabar
com a nossa raça, anos e anos sem parar.
- Viemos falar com Ian.
Um deles olhou-me de alto a baixo, com desdém e perguntou.
- Têm audiência marcada?
- Digamos que dei com esta encomenda. - Disse-lhes pegando
no humano, puxando-lhe a camisola por detrás das costas, obrigando-o a ser
arrastado para um melhor campo de visão dos guardas.
Os dois olharam para nós ainda mais confusos.
- Bem, sigam-me. - Disse finalmente o guarda que não
simpatizava com a minha figura.
Isto vai ser interessante, pensei. Percorremos vários
corredores de pedra, iluminados com candelabros. Finalmente parámos em frente
de uma porta, que o vampiro abriu. Dava para uma sala de grandes dimensões. As
janelas estavam fechadas, e mais candelabros e velas davam ambiência àquele
espaço. As cores eram nomeadamente o vermelho e o dourado. Uma lareira também
ligada, aquecia a sala.
- Entrem. Comunicarei a Ian que desejam falar-lhe.
- Obrigado. - Agradeci.
O espaço era agradável... e também uma armadilha mortal,
para quem entrasse aqui desprevenido. Uma única saída – a porta. Mas não para
mim. Sorri, e dei uns passos para ver os pormenores da sala de mais de perto. O
homem não se mexia.
Uns dez minutos depois, reapareceu o vampiro que nos
trouxera até aqui, seguido de um rapaz alto. O vampiro ficou em posição de
defesa ao lado de quem eu supus ser Ian.
- Podes sair. - Disse naturalmente para o guarda. Este
voltou-se com uma expressão de protesto quanto àquela decisão, mas o rapaz
insistiu, fazendo apenas sinal com a cabeça. Não sabia bem o porquê, mas aquela
sua fisionomia me lembrava alguém… Como se eu o conhecesse, mesmo sem que nunca
o tivesse realmente visto. Nunca gostava muito quando isso acontecia, e tinha a
tendência a matar, para que tudo ficasse logo resolvido. Mas, como ele já
estava morto, calculei que não pudesse fazer muito.
Esperámos que o guarda saísse para que a conversa iniciasse.
Ele foi o primeiro.
- Que te traz aqui?
- Parece que houve um extravio de correio. - Disse-lhe
naturalmente.
- Vejo que sim. E porque vieste até aqui? Avisar-me para da
próxima vez, enviar alguém à altura de um vampiro? - Ia responder-lhe, mas ele
continuou. - Sabes, a razão por que enviei Yev, é porque ele também fazia parte
da encomenda. Ele era um presente.
- Já não bastava a cabeça, ainda ias oferecer um servo à
Sheftu? - Perguntei-lhe, e reparando na reacção de surpresa que por momentos
deixou transparecer no rosto ao ouvir o nome da vampira.
- Obviamente a curiosidade fez-te arrancar informação do meu
mensageiro... - Disse, mandando um rápido olhar ao homem, que se encolheu todo.
- Mesmo assim, podias, ter enviado a cabeça deste servo numa caixa, seria muito
mais prático, do que vires todo o caminho até à Transilvânia.
- A razão por que vim é mais complicada. Quanto a este homem
podes fazer-lhe o que quiseres. Afinal ele pertence-te, visto que nunca chegou
a ser entregue a Sheftu.
- Podes ir! - Disse-lhe. - Volta para tua casa e continua as
tarefas que fazias antes de seres escolhido para a missão que te confiei.
- Senhor, desculpe... Eu não queria... Mas ele era demasiado
forte... - Disse tremendo e apontando na minha direcção. - Ele usou magia...
magia para torturar-me.
A expressão de Ian mudou ao ouvir a palavra magia, parecia
estar perturbado e preocupado.
- As tuas palavras foram registadas, podes ir.
Assim que o homem saiu, só restávamos nós os dois na sala. O
silêncio preencheu o espaço por alguns momentos, e depois Ian voltou a falar.
- Magia?!
- Não é nada do outro mundo. Criaturas sobrenaturais têm
tendência para desenvolver melhor certas qualidades, como a magia.
- Mais um vampiro dotado de magia.
- Eu conheço uns poucos, mas ao que parece, pareces estar
surpreendido.
- Meu filho tem dotes nessa área.
Filho? Ian tem um filho? A realidade é que as surpresas
estavam a ser demasiadas para o meu gosto, e bem sabia que brevemente retiraria
as informações que necessitava. Era uma questão de tempo.
- Um prodígio, com certeza. - Assegurei-lhe.
- Hum... Há divergências entre nós.
Bem, parece que é facto, no que refere a vampiros, pais e
filhos não se dão. Um silêncio estranho pairou, e eu achei por bem, ir ao que
interessava.
- Hum... Mas, vamos ao que me trouxe aqui. Preciso de umas
informações...
- Que tipo de informações?
- Sheftu... Bem, se souberes de outros que estejam com ela,
também aceito.
- Sheftu?! Mas por que queres saber informações dela?
- É necessário, por acaso, existir alguma razão para que te
peça informações? – Ele franziu o sobrolho, começando a ficar ligeiramente
desconfiado… Eu me perguntava o que este tal de Ian tinha a ver com a vida de
Sheftu.
- Não esperas que eu to diga. O que necessitares, sempre
podes perguntar-lhe directamente. Ah, e aproveita e pede-lhe para atender ao
meu pedido.
- E quem te disse que eu era o pombo-correio? –
Perguntei-lhe, já começava a irritar-me profundamente, podia retirar cada
informação dele apenas com um ligeiro pensamento. Mas havia muito mais em jogo.
Precisava dele, apesar de ainda não saber bem porquê. - Bem... Como é que eu
hei-de explicar? – Fiz uma breve pausa, depois de ter amenizado um pouco o meu
tom. A última coisa que ia precisar era criar aqui um inimigo, brevemente ainda
me seria útil. - As coisas lá, pela mansão, estão um pouco complicadas...
Provavelmente não sabes, mas houve um ataque…
- Os recém-nascidos? Aquando a captura de Sheftu aqui para o
castelo? Mas isso já foi há muito tempo!
Então fora isso que se passara, para a casa estar
parcialmente destruída, quando lá chegámos. Tentei esconder esta minha surpresa
com a revelação. Talvez fosse por isso que tinha mandado o presente,
para pedir desculpas pela traição que tinha feito.
- Bem... A verdade é que houve um novo ataque.
- O quê?
- Sim. E agora as coisas estão um pouco instáveis. Eu estou
a tentar ajudar.
- A Sheftu? Ela está bem? - A sua preocupação era alarmante.
- Bem...
Ele veio direito a mim e colocou os braços sobre os meus
ombros e abanou-me.
- Diz-me só se ela está bem!
- Sim, está. - Assegurei-lhe, não muito certo da relação que
eles tinham. Cada vez mais aquela loira me intrigava!
Ele respirou fundo, afastando-se, agora mais calmo.
- Era só isso que eu queria ouvir. – Suspirou profundamente,
antes de me pedir para sentar numa cadeira que estava a um canto, e eu não via
a hora de conseguir o que queria. – Bem, por onde começamos? Não sei ao certo o
que ela já te contou… E quanto a informações dos restantes, não os conheço e
ela raramente fala deles.
- Vocês têm por hábito comunicar? – Perguntei, alarmado. Não
queria que soubessem o que eu andava a fazer, não por enquanto.
- Antes comunicávamos até regularmente, principalmente
quando ela queria caçar Gustav. Mas depois um empecilho, como deves calcular,
conseguiu destruir um pouco isso. Devia ter acabado com ele quando podia.
- Empecilho? – Perguntei, calculando que fosse aquele que
estava com ela. Algo dentro de mim remoeu, mas decidi calar isso. Ian apenas
abanou a cabeça, remetendo-se a mais um silêncio que começava já a saturar-me.
Teria de ficar aqui o maldito dia todo até conseguir retirar todas as
informações que queria?
- Mas o que queres saber ao certo? São milénios de história,
não sei como ajudar-vos nessa batalha. Talvez seja melhor ir ter com eles.
- Não! – Exclamei, demasiado rápido porque ele facilmente
desconfiou de algo. – Nós conseguimos neutralizar a situação. Apenas necessito
de saber um pouco mais sobre o seu passado para tentar ajudar. – Por momentos
pensei se era ou não uma boa ideia prosseguir, mas não perdia em nada com isso.
Talvez até acelerasse de uma vez por todas tudo isto. – Eric ficou ferido e
parece que perdeu os seus poderes…
Uma gargalhada se fez estrondosa, observei-o curioso. Por
alguma razão ele estava contente, o que me conseguiria abrir tudo o que eu
precisasse de saber. E rapidamente meu sorriso se formou, principalmente quando
ele começou a contar-me o que tinha acontecido para ele ter preparado aquele
ataque anterior a eu ter renascido das cinzas.
Parecia que existia uma neblina no meio de toda aquela
história contada na versão de Ian, mas pelo menos já tinha uma ideia do que
tinha para enfrentar: um completo mistério. E isso ainda me dava mais alento
para seguir em frente. Adorava quebrar mistérios, principalmente se fosse eu a
ganhar com isso. Com que então ela tinha nascido no Egipto, sobre todo aquele
misticismo e poder. O que mais me surpreendia era a sua idade, demasiados
milénios para contar, demasiado tempo para conseguir certezas sobre ela. Mas,
uma coisa era certa: aquela coragem e força louca que conseguia tudo o que
queria, era algo que eu tinha de ter cuidado.
Quem diria que aquela loira provocasse tanta confusão, tanto
medo e se tornasse uma lenda. Mas, seria tudo verdade? Ou, se não o fosse, o
que era real e o que era ficção? Só havia uma maneira de descobrir, estando
mais perto, procurando nos pequenos movimentos… Mesmo longe, ainda conseguia
recordar-me da sua aura, talvez pela quantidade de mortos que tinha feito, ou
por aquele poder que não sabia de onde vinha. Um dia, mais cedo ou mais tarde,
eu acabaria por descobrir. Agora, chegava a hora de voltar para perto de Rania.
Havia ainda muito a ser feito.
- Agradeço a tua hospitalidade, Ian. - Disse-lhe, ao mesmo
tempo que me levantava.
- Espero ter sido útil. - Disse. Levantando-se também. - E é
certo que neste momento não é muito aconselhável eu deixar Transilvânia, por
isso gostaria de pedir-te um favor.
- Sim, diz! - Respondi prontamente. A última coisa que eu
queria era que ele fosse até a Escócia. Portanto faria de tudo, para mantê-lo
aqui.
- Sei que não é tua responsabilidade... Mas peço-te que
protejas Sheftu. - Fez uma pequena pausa. - Ela é importante para mim. Gostava
também que transmitisses a mensagem de que gostava de a ter a meu lado. E que
um lugar de soberania a espera aqui na Transilvânia. Assim que ela decidir
voltar, estarei à espera.
- Assim farei.
Na realidade não estava com muitas intenções de ir até
Sheftu e contar-lhe deste lugar ou sequer de Ian e sua proposta. Veremos o que
o futuro proporciona. Já quanto à protecção de Sheftu, é bastante óbvio que não
vou deixar nada acontecer-lhe. Afinal de contas, ela é minha.
Ian abriu a porta que dava para o longo corredor, e cá fora
já nos esperava o guarda de há pouco, que não arredara pé.
- Uma boa viagem de regresso. E se for preciso ajuda podem
contar connosco.
- Obrigada uma vez mais. - Respondi-lhe.
Segui o guarda, enquanto Ian voltou a fechar-se naquela
sala. Provavelmente a reflectir nesta minha visita inesperada.
Chegámos finalmente à entrada do castelo, e foi quando
reparei que o guarda deixara de acompanhar-me. Reparei que eu estava a um passo
de colocar o meu pé no chão de pedra onde o sol incidia. Foi então que percebi.
Avancei um passo, e o meu corpo foi inundado pela luz e calor daquele sol.
Voltei-me na direcção dos guardas e disse:
- Está um belo dia, não acham rapazes? - O meu sorriso
irónico e provocador deixou-se transparecer em meus lábios.
Claramente, que se aqueles vampiros ousassem expor-se à luz
do sol, ficariam em cinzas. E as suas expressões furiosas, perante a minha
provocação, eram demasiado satisfatórias. Já tinha ganho o dia com pontos
extra.
Deixei-os remoer, e afastei-me. Tinha que voltar.
Percorri o caminho até à muralha, mas nesta altura, o espaço
estava mais movimentado, e então decidi escolher um outro sítio para poder
desaparecer.
Caminhei nas ruelas, entre casas que ainda inspiravam uma
tradição antiga, e finalmente encontrei uma pequena praça deserta. O local
ideal.
Concentrava-me para poder teletransportar-me, quando sinto
uma pequena corrente de ar passar atrás de mim. Volto-me nesse instante,
somente para deparar com um vazio. Parecia-me estranho, mas talvez fosse mesmo
só uma corrente de ar.
Era tempo de voltar, não tinha tempo para isto. Mais uma vez
concentrei-me e desapareci daquele lugar.
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